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Reportagem: Moonspell, Rotting Christ e Silver Dust @ Capitólio, Lisboa - 05/11/2019


O mais recente álbum dos Moonspell, “1755”, lançado em 2017, pode já não ser uma novidade. Porém, o facto de a banda ter iniciado recentemente uma tour europeia com cerca de 50 espetáculos, que visam precisamente promover esse trabalho, pode ter surpreendido os mais distraídos. A turné arrancou em Hamburgo no passado dia 24 de outubro e Portugal foi contemplado com duas datas. Dia 4 de novembro no Hard Club no Porto e no dia seguinte em Lisboa, no Capitólio. Nós estivemos presentes na segunda.

Mesmo sendo uma banda que já não tem nada a provar dentro do heavy metal, os Moonspell pretendem sempre ir mais além. Poderiam ficar a repousar sobre o sucesso de que gozam, editando álbuns em que a fórmula seria sempre semelhante e garantiria bons resultados, à partida, mas recusam-se a fazê-lo. “1755” é um claro exemplo de que a banda pretende sempre mais. Embora cantar em português não seja propriamente uma novidade para eles, nunca o tinham feito ao longo de todo um álbum como acontece em “1755”. Para dificultar ainda mais as coisas, decidiram compô-lo todo em volta de um tema, que aborda a maior tragédia ocorrida em solo nacional, ou seja, o terramoto de 1755. A acompanhá-los nesta tour estão duas bandas com um som bastante distinto. Os suíços Silver Dust com o seu metal gótico, praticamente desconhecidos em Portugal e os já consagrados gregos Rotting Christ, com o seu black metal.

Eram 19h30 quando pela moldura colocada no centro do palco começaram a surgir fotos de figuras, no mínimo “esquisitas”. Eram as personagens a que se referem as músicas que compõem o mais recente registo dos Silver Dust, “House 21”. A sua atuação foi toda ela feita em torno desse álbum, começando logo com “The Unknown Soldier”. O metal gótico destes suíços contagiou imediatamente o público presente, que por esta altura ocupava já meia casa. Com um espetáculo muito teatralizado, que recorria constantemente às imagens digitais que passavam na já referida moldura, continuaram com “House 21” e “Forever”, música em que o vocalista se muniu de uma guitarra para, logo após esse tema, optar por fazer um solo que não foi muito bem recebido. Principalmente quando (qual guitar hero), começou a lamber as cordas do instrumento. Tempo mal aproveitado para quem dispunha apenas de pouco mais de meia hora de atuação. Na ponta final do concerto voltaram a ter público com eles, que pulou ao ritmo de “La La La La” e “The Calling”. 

Quem segue com atenção os concertos dos Moonspell, sabe que eles se costumam fazer acompanhar nas suas turnés por bandas estrangeiras com nomes sonantes. Basta recordar os Lacuna Coil, Therion, ou mais recentemente os Septicflesh. Desta vez os escolhidos foram os gregos Rotting Christ. Banda no ativo desde 1988, com cerca de treze álbuns de originais gravados e que parecia não querer perder a oportunidade de brindar os fãs portugueses com alguns temas do mais recente “The Heretics”. O pano de fundo com a capa desse álbum apontava nesse sentido, mas, tal não se veio a confirmar.
Eram 20h30 quando começaram a sua atuação para um Capitólio que já se encontrava cheio. Houve quem dispensasse a atuação dos Silver Dust, mas não a dos Rotting Christ. Não foi, no entanto, com nenhuma faixa de “The Heretics” que iniciaram o concerto, mas sim com o tema “Χ ξ ς”, muitas vezes escolhida para primeira música dos seus espetáculos. Tivemos que esperar até ao terceiro tema para que chegassem ao último trabalho. “Fire, God and Fear” foi o escolhido. O público parecia rendido à atuação dos Rotting Christ e a banda aparentava estar a gozar cada minuto em palco, tal era a entrega dos seus elementos. “Κατά τον δαίμονα του εαυτού” veio provar que a noite não era mesmo para promover “The Heretics”, longe disso. Os seus clássicos foram o prato principal, apenas interrompidos aqui e ali pelos novos temas. A seguir a “Dies Irae”, uma das poucas músicas novas, ouve tempo para “Forest of n´Gai”, “Societas Satanas”, “Grandis Spiritus Diavolos”, “The Call of the Aethyr” e claro, “King of a Stellar War”, seguido de “Non Serviam”. Atuação segura dos Rotting Christ que, com a sua entrega, conseguiu conquistar o público, embora tocando poucos dos seus temas novos.

Assistir a um concerto dos Moonspell é sempre satisfatório, mas quando eles são cabeças de cartaz o espetáculo torna-se único. Nesta atuação em concreto, foram quase duas horas de música. Tempo suficiente para nos presentearem com temas do seu último álbum, a que juntaram muitos dos seus clássicos. O pano de fundo que servia de cenário ao concerto daquela noite, mostrava as ruínas de uma qualquer igreja, das muitas que colapsaram com os abalos do sismo de 1755. Às 22h00, Fernando Ribeiro surgiu em palco, segurando uma candeia, que parecia ajudá-lo a mover-se por entre os escombros. Começaram a ouvir-se os primeiros acordes de “Em Nome do Medo”, que foi cantado juntamente com o público. Os temas “1755”, “In Tremor Dei” e “Desastre” obtiveram a mesma resposta, todos eles cantados a uma só voz por todo o Capitólio. Até este momento o alinhamento respeitava a sequência do álbum, altura em que os Moonspell interromperam a sua atuação para agradecer a todos os presentes. Seguiu-se um desfilar de clássicos de outros álbuns com “Opium”, “Awake”, “Night Eternal”, “Abysmo”, “Breath (Until We Are No More)”, “Extinct” e “Everything Invaded” que colocaram a audiência em delírio. Só após esta sequência decidiram voltar a “1755” e fizeram-no com o tema “Evento”, para logo de seguida brindarem a audiência com nova dose de êxitos. Desta feita foram “Mephisto”, “Vampiria”, e obviamente, “Alma Mater” que, não sendo um segundo hino de Portugal, conforme Fernando Ribeiro referiu, o é certamente para a comunidade metálica (ou metaleira, se preferirem) que se exprime em português. Se os Black Sabbath não podem deixar o palco sem tocarem “Paranoid”, o mesmo sucede com os Moonspell em relação a “Alma Mater”, tema que conta já 24 anos e foi cantado por pais e filhos que se encontravam entre o público.

Quem se deslocou ao Capitólio naquela terça-feira, ainda não se encontrava completamente satisfeito. O concerto não poderia ter já terminado e por isso houve que chamar pelos Moonspell, para que eles regressassem. A banda assentiu e aproveitou para retomar o álbum “1755” através do tema “Todos os Santos”. Seguiu-se a surpresa “Trebaruna”, que segundo Fernando Ribeiro não estava no set list para aquela noite e, por fim, “Full Moon Madness”, pois estes lobos, que foram homens, tinham que se retirar. Durante a atuação dos Moonspell, Fernando Ribeiro falou sobre a importância de tocar em Portugal. Segundo ele, é aqui que o conjunto renova as energias para enfrentar a tour. Muito aplaudidos, de falta de apoio os Moonspell não se podem certamente queixar. Com fãs em todo o mundo, eles sabem que é em solo português que são mais acarinhados. Talvez devido à partilha da nacionalidade.

Uma palavra final para a banda que esteve toda ela muito bem e pareceu dar tudo o que tinha. Não querendo individualizar, a forma como os solos de guitarra de Ricardo Amorim parecem hipnotizar o público, só é explicável pela beleza dos mesmos aliada à qualidade da sua execução. Os Moonspell prometeram um novo álbum de originais para o ano de 2020. Vamos aguardar ansiosamente por ele e pela consequente turné.


Texto por António Rodrigues
Fotografias por Daniela Jácome Lima
Agradecimentos: Prime Artists