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Entrevista a Ryoji Shinomoto


Para muitos, Alexi Laiho foi um dos maiores guitarristas da sua geração. Para Ryoji Shinomoto, foi mais do que isso: um farol criativo, um herói de juventude e, mais tarde, uma presença real nos bastidores da sua carreira. Conhecido pelo seu trabalho à frente dos RYUJIN (antigos GYZE), o músico japonês cresceu entre partituras de guitarra clássica e o fogo punk, mas foi ao descobrir os Children of Bodom que a sua verdadeira identidade musical começou a ganhar forma: melódica, feroz e inconfundivelmente única.
Em “Children of Bushido”, o seu primeiro álbum a solo, Ryoji presta homenagem a Alexi da forma mais pessoal possível: fundindo o death metal melódico ocidental com a alma do Japão ancestral. Lançado no dia em que Laiho completaria 46 anos, o disco é tanto uma carta de amor como um ato de legado, um tributo onde o espírito do “wildchild” finlandês encontra o código de honra dos guerreiros samurais.
Nesta entrevista exclusiva, Ryoji fala connosco sobre como Alexi moldou o seu caminho, os bastidores emocionais por trás desta homenagem singular, e como encontrou uma nova liberdade criativa no cruzamento entre dois mundos: o de Bodom e o de Bushido.

M.I. - O que significaram Alexi Laiho e Children of Bodom para ti pessoal e musicalmente - e como moldaram o teu percurso artístico?

Inicialmente estudei guitarra clássica, mas tudo mudou quando descobri os KISS. Foi aí que percebi que me queria tornar um músico de rock - alguém icónico, alguém maior do que a vida. A partir daí, também entrei no punk e noutros géneros, mas só quando conheci o Alexi Laiho e Children of Bodom é que percebi realmente que tipo de música queria fazer: melódica, mas agressiva.
Alexi era um verdadeiro herói da guitarra. Praticar os seus solos foi provavelmente o que me transformou no guitarrista de metal rápido que sou hoje. Mesmo vocalmente, a sua influência ajudou a moldar o estilo que uso agora.
Quando era adolescente, era simplesmente um fã. Vi-os ao vivo quando fizeram tournée pelo Japão. Mais tarde, em 2015, a minha banda fez uma digressão com os Children of Bodom pela Ásia, e até fiz uma entrevista especial com o Alexi para uma revista de guitarra japonesa. Bebemos uns copos juntos durante essa digressão, e esses momentos continuam a ser especiais para mim.
A sua fusão da melodia clássica com o metal tornou-se a base do que agora chamo de “Samurai Metal”. A sua influência está profundamente presente no meu som e na minha visão.


M.I. - Lançar “Children of Bushido” naquele que seria o 46.º aniversário de Alexi é um gesto poderoso. Que emoções sentiste enquanto preparavas esta homenagem?

Foi uma experiência muito emocionante. Queria honrar a sua memória de uma forma que parecesse profundamente pessoal.
Originalmente, tinha planeado lançar o álbum, na data da sua morte em dezembro, mas descobri que a editora japonesa não estava apta a fazer um lançamento digital adequado.
Foi aí que comecei a conversar com a Napalm Records, e decidimos uma data de lançamento mundial para 8 de Abril, que por acaso era o aniversário do Alexi.
Enquanto trabalhava no álbum, comecei a sentir que estava a criar algo novo, não apenas a fazer covers das suas músicas. O processo de arranjo, especialmente os elementos japoneses, foi muito semelhante à forma como costumo trabalhar com RYUJIN.
Lançá-lo no seu aniversário tornou-se uma forma de expressar a minha gratidão e de levar o seu legado mais longe para novos ouvintes.


M.I. - Conheceste bem o Alexi, ou essa homenagem foi construída mais a partir de uma ligação profunda com o seu legado?

Sim, conheci o Alexi durante a digressão asiática de 2015, onde os GYZE (agora RYUJIN) e os Children of Bodom partilharam o palco em vários concertos. Tive também a oportunidade de o entrevistar para uma revista japonesa de guitarra. Até fomos beber uns copos durante essa digressão, e esses momentos continuam a ser muito especiais para mim.
Não éramos amigos próximos, mas interagíamos definitivamente, e isso significava muito para mim. Depois, esta homenagem vem tanto de uma ligação pessoal como de um profundo respeito pelo seu legado.


M.I. - A fusão do death metal melódico ocidental com a instrumentação tradicional japonesa é impressionante. O que te inspirou a unir estes dois mundos musicais? Podes falar-nos mais sobre os instrumentos tradicionais japoneses específicos utilizados no álbum e como os adaptaste para se encaixarem na estrutura agressiva do metal moderno?

Sempre quis criar uma forma de metal verdadeiramente japonesa. Em “Children of Bushido”, utilizei instrumentos tradicionais como o shamisen, o shinobue e o ryuteki, juntamente com elementos sinfónicos. Além disso, muitas vezes substituí as escalas originais pelas tradicionais japonesas. É o mesmo processo que costumo utilizar quando trabalho nas músicas dos RYUJIN.
Tentei preservar ao máximo a essência das faixas rítmicas originais, não queria quebrar o que já estava completo. Em vez disso, concentrei-me em transformar as escalas e a sensação rítmica em algo mais japonês. Foi assim que consegui misturar tudo de forma natural.


M.I. - Como escolheste que faixas dos Children of Bodom reinterpretar para “Children of Bushido”? Houve alguma que te pareceu especialmente significativa ou assustadora de abordar?

Escolhi músicas que tinham um significado pessoal para mim, especialmente aquelas que ouvi quando me tornei fã dos Bodom.
Na verdade, as raízes dos RYUJIN remontam a uma banda de covers de Bodom que eu tinha no início, por isso muitas das faixas que escolhi eram aquelas que costumávamos tocar naquela altura. Também dei prioridade a músicas que senti que poderiam ser efetivamente reimaginadas com um toque japonês. A certa altura, pensei em fazer um cover de “Hate Crew Deathroll” com amigos convidados como Matt dos Trivium (o nosso produtor) e Petri dos Ensiferum. Mas, no final, decidi fazer tudo sozinho para manter a homenagem mais pessoal e sincera.


M.I. - Mantiveste-te fiel aos arranjos originais ou permitiste-te liberdade criativa para os reinventar com uma nova identidade cultural?

Como já referi anteriormente, tentei preservar a estrutura central dos arranjos originais, especialmente os elementos básicos da banda.
No entanto, quando se tratava de instrumentos que não eram de banda, permitia-me total liberdade criativa.
Embora tenha respeitado o espírito das músicas originais, reinventei os arranjos, a instrumentação e o fluxo emocional através do filtro do meu próprio estilo, aquilo a que chamo “Samurai Metal”.


M.I. - Qual foi a música mais emocionalmente difícil de gravar neste álbum e porquê?

Diria que “Bodom After Midnight” foi a mais desafiante, não tanto em termos de arranjo, mas no processo de mistura.
Como tratei não só da gravação, mas também da mistura e masterização sozinho, encontrar o equilíbrio certo para aquela faixa levou algum tempo.
Normalmente gosto de misturar tanto como de gravar, é um processo criativo que adoro. Mas tentar captar o lado afiado e agressivo do terceiro álbum dos Bodom foi bastante difícil, principalmente porque o meu estilo tende a envolver muitas faixas em camadas. Ainda assim, sempre que estou a misturar, sinto-me incrível... é uma das minhas partes favoritas da produção musical.


M.I. - Este é o teu primeiro lançamento a solo… o que significa para ti estar sob os holofotes desta forma, especialmente num projeto tão profundamente pessoal?

Deu-me uma sensação de liberdade. Dito isto, sempre fui o principal compositor e produtor dos RYUJIN, por isso, em termos de trabalho real, este projeto não foi assim tão diferente.
No entanto, lançá-lo com o meu próprio nome ajudou a garantir que os RYUJIN não fossem confundidos com uma banda de covers. Mais importante ainda, os meus sentimentos por Alexi eram profundamente pessoais, pelo que não senti necessidade de partilhar este processo com outras pessoas.
No futuro, pretendo usar o meu nome a solo para projetos de covers e até para experiências criativas que vão muito além do metal. Queria criar um espaço onde pudesse estar completamente livre.


M.I. - Como equilibraste a homenagem ao estilo único do Alexi e, ao mesmo tempo, a expressão da tua própria voz musical?

Na maior parte do tempo, usei o meu estilo vocal habitual. Esta é a voz que desenvolvi ao longo do tempo e queria manter-me fiel a ela.
Dito isto, fiz referência às performances originais em determinados locais, especialmente para captar o espírito da performance de Alexi. Acrescentei também alguns elementos originais, como falas japonesas nos backing vocals e frases gritadas.
As pessoas geralmente focam-se no Alexi como guitarrista, mas ele também era um grande vocalista. O estilo vocal dele era diferente do meu, mas essa diferença tornou a reinterpretação mais significativa. Acredito que a minha própria voz ainda saiu claramente nestes covers.


M.I. - O que simboliza a palavra “Bushido” no contexto deste álbum - não só filosófica, mas musicalmente?

A ideia do nome “Children of Bushido” surgiu de um comentário no YouTube sobre a faixa de colaboração dos RYUJIN com Matt-Raijin e Fujin.
Alguém deve ter sentido uma ligação entre RYUJIN e Bodom, e substituiu “Bodom” por “Bushido”. Quando decidi criar uma homenagem a Bodom ao estilo japonês, a palavra “Bushido” pareceu-me a combinação perfeita.
Não só carrega um profundo significado cultural e filosófico, como, neste caso, captou a essência do que esta homenagem se tornou... uma reinterpretação japonesa dos Children of Bodom.

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Entrevista por Sónia Fonseca