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Soen - "Tellurian" Review


Ser visto como uma cópia dos Tool é um rótulo que tem tanto de pesado como de ingrato. Os Soen sofrem desta maleita desde os seus primórdios, mas apesar de reconhecerem que foram beber às influências dos americanos, reivindicam que aquilo que fazem é diferente de tudo o que existe. A verdade andará certamente nos meandros destas duas premissas, mas isso não é o mais importante aqui. No ano passado, os Soen voltaram, já sem Steve DiGiorgio, aos lançamentos e os resultados são mais que aprazíveis. 

O novo álbum chama-se “Tellurian”, uma palavra latina que deriva de “Tellus”, ou seja, “terra” em português e a verdade é que este segundo lançamento dos suecos é tão sólido, homogéneo e orgânico que o nome assenta que nem uma luva ao álbum. Ao longo de oito faixas (“Komenco” é uma pequena introdução ao álbum propriamente dito), os Soen trazem-nos um álbum viciante, intimista, delicado e onde nada fica por dizer. Este é um conjunto de canções menos “metal” do que o antecessor “Cognitive”, mas é igualmente mais maduro e arrebatador, o que parece até um pouco estranho, já que ao segundo álbum o quarteto parece estar já no seu ponto de rebuçado. A banda surge aqui mais melódica e num tom mais progressivo, que enfatiza de certa forma a qualidade dos músicos que compõem a banda. “Tellurian” oferece um vasto leque de canções onde temos a sensação de tocar em algo quente e frio ao mesmo tempo: a ambiência do álbum passa por muitos estados e assim que termina é notável a heterogeneidade de sensações, imagens e pensamentos que nos foram oferecidos sempre na mesma toada à la Soen. Esta é uma viagem que se faz por gosto e em piloto automático, uma daquelas epopeias que, por mais que já se conheçam todos os sítios visitados, vale sempre a pena voltar ao ponto de partida, sabendo que no final voltaremos novamente… ao início. Esta intuição que nos faz querer experienciar mais e mais o que nos entra pelos ouvidos a dentro leva-nos a um estado em que já conhecemos o álbum, mas ao mesmo tempo ele nos é completamente desconhecido. As canções metamorfoseiam-se umas às outras e adulam-se mutuamente, como se o que se sabe e o que se desconhece fosse a mesma coisa. “Koniskas” e “Kuraman” carregam estes sinais quando reproduzidas. 
A voz de Joel Ekelöf é a manda-chuva de todo este complô. Quando “The Words” se faz ouvir, os holofotes apagam-se e brilha o vocalista, que pauta, pinta e risca a canção como se lhe dá na gana. Joel tem uma voz que quando se ouve não se esquece mais. Um daqueles vozeirões capazes de mudar um estado de espírito apenas com um ou dois versos vociferados e isso é bonito de se ouvir e sentir. Os temas mais curtos são aqueles que mais seduzem pela sua criatividade e pela negação de uma repetição excessiva que desmotiva e aborrece quem ouve. “Tabula Rasa”, que nas primeiras audições parece uma canção algo básica e superficial, vai sofrendo mutações à medida que lhe é dado mais tempo de audição. Em boa hora se percebe que em “Tellurian” não há nada verdadeiramente banal e supérfluo.
Em termos de performance, não existem elos fracos nesta banda, aliás, Stefan Stenberg está tão forte no baixo que só os mais pertinazes se lembrarão da ausência de DiGiorgio. Martin Lopez está irrepreensível como nos habituou, desafiando o inexecutável, e Platbarzdis também tem os seus momentos de espectacularidade. Outra coisa que é necessário realçar é a qualidade das letras, muito bem escritas, focando assuntos existenciais e de reflexão duradoura. Com efeito, as letras são a verdadeira originalidade da banda, já que existem realmente parecenças com o som dos Tool, embora, no meu ponto de vista, não sejam tão significativas quanto isso. 

Os dois últimos temas de “Tellurian” – “Void” e “The Other’s Fall” – são provavelmente as faixas mais ambiciosas que os suecos tentaram conceber até hoje, ultrapassando os oito minutos de duração, repetindo-se um pouco, perdendo alguma capacidade de atracção, mas mostrando uns Soen mais maduros e uma faceta muito bem-vinda na sua sonoridade. De resto, este deverá ser o caminho a ser trilhado pelo quarteto sueco nos próximos lançamentos. Com este segundo álbum, os Soen dão um pontapé na monotonia e na saturação que se nota um pouco por todos os géneros musicais e, parece-me, deixam aqui um álbum que resistirá ao duro teste do tempo. O tempo que parece que não passa neste álbum…

Nota: 9.4/10

Review por Pedro Bento