A primeira atuação esteve a cargo dos Colosso, que provaram isso mesmo. Debaixo de um calor abrasador (nos primeiros instantes, o vocalista André Macedo já limpava o suor à camisola), provaram que quando se é bom, as adversidades ultrapassam-se. Entraram, pediram um circle pit e o público acedeu. À medida que a atuação ia decorrendo, o público cada vez se manifestava mais. Certamente ganharam mais fãs, a julgar pela reação de alguns, quase “surpresos” perante a presença dos portuenses. Destaque para “Circle Of Defeat”. Colossais – o nome da banda assenta-lhes bem.
Seguiram-se os nuestros hermanos Killus, muito provavelmente a banda mais “deslocada” dos três dias de festival, no que ao estilo musical, à sua apresentação e às temáticas diz respeito. Donos de um metal industrial com influências de rock gótico/death rock, surgem em palco de cara pintada, muito teatrais, por vezes cambaleando que nem zombies. O palco estava decorado com túmulos. Sempre comunicativos com o público (quer por palavras, sempre na língua espanhola, quer por gestos), mostraram-se satisfeitos com o facto de tocarem em solo nacional pela primeira vez (algo praticamente indesculpável, dado que existem há quase 20 anos e estão mesmo aqui ao lado). A atuação do baixista Premuttox esteve em grande destaque, quer pelas suas expressões faciais, quer pelas suas atitudes (quase!) obscenas, como esfregar os genitais ou cuspir nos seus colegas (sempre num ambiente de riso, com o qual o público se foi divertindo e mostrou recetividade). Realçaram-se os temas “Satanachia”, “Ultrazombies” e “Feel The Monster”. Uma boa aposta da organização.
O palco Loud! do terceiro dia foi inaugurado pelos Don’t Disturb My Circles, que puseram as primeiras filas completamente ao rubro. Foi um dos nomes que também mais se destacou no palco das bandas nacionais. Humildes nas suas palavras, são donos de uma sonoridade particular, que funde o metal e o hardcore, e iam deitando o palco abaixo com a sua agressividade, completamente correspondida pelo público. Uma descarga emocional intensa.
Surge mais um dos grupos veteranos desta edição. Os norte-americanos Obituary entraram em palco e, de imediato, parte da plateia reuniu-se num circle pit que persistiu até ao fim da atuação. Desde a última aparição em terras lusas, lançaram um novo álbum, homónimo, que parece ter tido maior aceitação comparativamente ao anterior “Inked In Blood”. Contudo, continou a ser nos clássicos, como “Insane” ou “Chopped In Half”, que o público se manifestou com mais fervor. Notou-se algumas pausas entre temas, o que é compreensível se nos recordarmos que não só estávamos ainda a suportar as últimas réstias de calor, como também pelo facto dos músicos já contarem com mais de três décadas de existência. Facto aproveitado pela banda para brindarem com o público português vezes sem conta. Apesar disso, mostraram ainda estar em muito boa forma.
Regressamos ao palco Loud! com os Grog, veteranos do grindcore. Os lisboetas lançaram recentemente o álbum “Ablutionary Rituals”. Independentemente de ser-se fã ou não do género, o certo é que os vocais de Pedro Pedra não deixaram ninguém indiferente, e qualquer pessoa que por ali passasse ter-se-á sentida esmagada pelo poderio do grupo. Os Grog são o caos na Terra, e as primeiras filas celebraram esse caos com mosh pits respeitáveis.
Surge um dos momentos mais esperados da noite (principalmente, a julgar pelas muitas t-shirts envergadas na plateia com o nome da banda norte-americana). Os The Dillinger Escape Plan são matemática aplicada à música. Pode até demorar algum tempo, mas quando ela é absorvida pelo nosso sentido auditivo torna-se absolutamente viciante. Recebendo a notícia de que pretendem terminar o seu percurso e despedir-se dos palcos, quase que surge um sentimento de revolta (aquilo que é bom, devia ser eterno). Perante isto, falhar esta atuação seria uma facada. Quando o vocalista Greg Puciato e os restantes membros entram em palco, o caos instalou-se ao som de “Prancer”. É difícil saber por onde começar. A voz de Puciato é simplesmente alucinante, passando do som mais grave ao mais melódico num ápice (basta pensar em temas como “Black Bubblegum” ou “Surrogate”). Os maravilhosos riffs…sentimo-los de forma estonteante. São complexos, são agressivos, são extremamente emocionais. Em “One Of Us Is The Killer” e “Farewell, Mona Lisa”, a voz do público chegou a fundir-se com a de Puciato. Já falámos de caos, certo? Puciato deu cabeçadas nas colunas. Pontapeou a bateria. A atuação termina com 43% Burnt e uma sensação, no mínimo, agridoce. Foi bom, mesmo muito bom enquanto durou. De corações arrebatados, ficou uma certa leveza no ar depois de tamanha descarga de emoções; porém, uma profunda tristeza por saber que não irá repetir-se.
O palco Loud! encerrou com a atuação (ou devemos dizer ritual?) dos The Ominous Circle. Chegaram de vestes longas e cara tapada, conforme esperado. Não comunicando propriamente com o público, criaram um ambiente misterioso com a ajuda de fornalhas a compor o palco. E no lugar de mosh ou circle pits, a plateia gozou de um efeito espelho perante a banda e, da mesma forma, sentiu a sonoridade de forma algo obscura.
Aos Trivium coube a tarefa de fechar a edição do festival. É estranho pensar que uma banda tão (re)conhecida no mundo do metal pisou os palcos portugueses apenas pela segunda vez, tendo em vista que conta com quase duas décadas de existência. Depois de ouvirmos “Run To The Hills”, dos Iron Maiden (banda que o vocalista e guitarrista Matt Heafy comentou ser uma referência para si), eis que a banda surgiu em palco, iniciando com “Rain” e, depois, “Watch The World Burn”, no qual se ouve o público a cantar em uníssono. “Tudo bem?”, perguntou Heafy, que se mostrou bastante simpático e comunicativo ao longo da noite. Tocaram o seu recente single, “The Sin and the Sentence”, e Heafy elogiu a reação do público português, indicando que foi uma das melhores da presente tour (já sabemos que são muitas as bandas que gostam de massajar o ego dos seus fãs, mas vamos ignorar tal facto!). Foi nesta altura que começaram a surgir circle pits contínuos. Por vezes, pareceu existir alguma dissonância entre a voz de Heafy (nos momentos mais melódicos) e o instrumental, mas não é que tenha abalado a qualidade da atuação. Os últimos temas da noite, “Dying In Your Arms”, “Throes Of Perdition” e “Like Light To The Flies” foram bastante aplaudidos, mas ainda tivemos direito a encore com a poderosa “In Waves”. Esperamos que regressem em breve.
Assim terminou mais uma edição do VOA, que elevou a fasquia para as próximas edições. Vemo-nos em 2018.
Texto por Sara Delgado
Fotografias por Hugo Rebelo
Agradecimentos: Prime Artists & PEV Entertainment