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Entrevista aos Moonspell

Amados por uns, odiados por outros, os Moonspell sempre agitaram as águas. O seu sucesso mundial nem sempre foi reconhecido no seu próprio país, Portugal… mas os lobos provaram do que são capazes! Após uma carreira de sucesso com quase 30 anos, “Hermitage”, o 13º álbum, está prestes a ver a luz do dia e eles mantêm-se fiéis às suas raízes controversas! 
Pedro Paixão e Hugo Ribeiro conversaram com a Metal Imperium sobre a longa carreira, o sucesso, a pandemia e, obviamente, o novo álbum. 

M.I. - Em primeiro lugar, muito obrigado por responderem às minhas perguntas. Em segundo lugar, parabéns pelo novo álbum! “Hermitage” é o 13º álbum de estúdio dos Moonspell! Consideram 13 um número da sorte? 

Pedro - Não. E dificilmente posso falar de superstições… 


M.I. - Alguns fãs expressaram o seu desapontamento com as novas faixas já reveladas. Por que acham que isso acontece? Acham que nas redes sociais há pessoas que comentam o álbum e falam mal só porque estão frustradas consigo mesmas? 

Pedro - Eu não sou nem psicólogo nem sociólogo para especular publicamente sobre as más reações que todos os álbuns geram, mas tenho consciência que o som dos Moonspell neste novo álbum pode (e deve) causar alguma desilusão em alguns fãs e que estes reflitam isso mesmo nas suas reações nas redes sociais. Acho isso incontornável.
De um ponto de vista pessoal, penso que é pouco racional ir para a “casa” das bandas, entenda-se Facebook e Instagram, etc, dizer mal dos donos. Parece-me apenas destrutivo. Mas como disse é compreensível que a música, mexendo profundamente com as emoções das pessoas, cause também algumas atitudes mais emotivas e, por vezes, negativas. Ossos do ofício (comes with the Job) de quem, como os Moonspell, faz a arte pela arte e só a nós nos diz respeito como preenchemos a música neste conceito. Ir mais fundo nas motivações pessoais de cada seria o mesmo que achar aceitável que sejam os fãs a conceber a nossa música. E como seria?


M.I. - Eu ouvi o novo álbum e, em geral, “Hermitage” é mais suave do que os outros. Era vossa intenção diminuir na “aspereza”? 

Pedro - Eu não lhe chamaria de intenção, não. Eu diria uma consciência! Estávamos cientes de que desacelerar a aspereza poderia ser uma consequência do caminho que seguíamos quando começamos a entender a natureza deste álbum. Estávamos à procura de mais melodias, mais sentimento, mais desenvolvimentos, mais progressão e, acima de tudo, ter a atmosfera principal bem presente ao longo do álbum. Acho que o último álbum, “1755”, tem falta de sensibilidade... Quer dizer, não era para a ter, e realmente não sinto falta dela no álbum, mas sim na música dos Moonspell. Isso é o que pode explicar a falta de aspereza. Por outro lado, os Moonspell têm alguns álbuns pesados ​​como “Memorial”, “Night Eternal”, “Alpha Noir” e “1755”, mas também e mais representativos alguns álbuns mais leves como “Sin”, “Irreligious”, “Darkness and Hope”, “Extinct”, “Omega White”. 


M.I. – Hermitage (eremitério) refere-se a "um lugar onde uma pessoa religiosa vive por conta própria, longe do resto da sociedade" e parece ser um título bastante apropriado para os tempos em que vivemos... o vírus e o confinamento foram determinantes para esta escolha? 

Pedro - Poderíamos dizer que sim e “aproveitar” uma questão tão premente, mas não seria verdade. O título e conceito do álbum são, pelo menos, um ano mais velho que a pandemia. Já há muito que sentimos uma alienação do que é humano pelos humanos, a um ponto tal que se desconhece a humanidade atual. Os grandes problemas, os grandes desafios, as grandes questões estão fora do radar do nosso primeiro mundo. Sendo gregários instintivamente, parece que distorcemos e extremamos de tal forma essa natureza que se criou um misto de fantasia e ilusão que, neste caso, se torna uma receita catastrófica. 
Mas sobretudo, como tudo em música, “Hermitage” é um sentimento, um desejo, um sonho até. Vivenciar períodos como o de março do ano passado, adicionou mais sal à fervura. Foi precisamente nesse período que mudei as músicas que já existiam, para o que se pode ouvir agora na versão final.


M.I. - “Hermitage” é o resultado do bloqueio de 2020? Ou já estavam a trabalhar nele antes da pandemia atingir o mundo? 

Pedro - Apesar de já ter respondido em parte a esta questão na resposta anterior, posso desenvolver. No verão de 2019 já tínhamos músicas suficientes para fazer o álbum e, por isso, fizemos uma sessão de pré-produção em setembro desse ano para gravarmos no inverno. Entretanto já tínhamos percebido que o resultado não nos satisfazia. Decidimos não gravar, até porque Moonspell teve que se reformular como banda culminando com a saída do Mike. Ainda assim, o Ricardo e eu, mantivemo-nos a compor e fizemos mais 3 músicas que constam no álbum, isto entre janeiro e março de 2020. Depois houve o confinamento em março e eu aproveitei para pegar em todas as outras músicas e reformulá-las até à exaustão na procura daquilo que nos preenchia artisticamente. Abençoada época de inspiração pois, a cada nova fórmula que eu enviava ao Ricardo e ao Fernando, a reação era sempre de admiração positiva! Quando nos pudemos voltar a juntar, já tínhamos um caminho muito mais definido e determinado. O Hugo entra e desenvolve mais as ideias que estavam nas baterias que programamos de uma tal forma apaixonada que, em certos momentos, mudámos um pouco as músicas. Depois, já no verão, foi apanhar pontas soltas, receber o produtor (Jaime Arellano Gomez) no nosso estúdio, mudar sons, limpar excedentes e seguir para estúdio. 
 

M.I. - O álbum foi gravado em outubro, nos Orgone Studios, no Reino Unido, com o produtor Jaime Gomez Arellano, famoso pelo seu trabalho com os Paradise Lost, Ghost, Primordial,... por que o escolheram? 

Pedro - Um amigo comum, o Ricardo S. Amorim, autor da biografia dos Moonspell – “Lobos que foram Homens” - sugeriu-nos baseado no seu profundo conhecimento, quer de Moonspell, quer da cena e nomes emergentes, defendendo que as suas produções refletiam muito honestamente o som da banda. Ou seja, a música do que produz é transparente, ouve-se a alma das bandas que gravam. PL, sim, Solstafir, e outros pesaram, como prova dessa orgânica que ele traz para as bandas. Também o facto de os Paradise Lost comporem o trabalho com o Jens Bogren (produtor do “Extinct”) estabeleceu-nos uma solida referência. O Fernando colocou logo essa responsabilidade de escolha sobre mim e sobre o Ricardo e nós pouco hesitámos. Foi escutar o trabalho do Gomez e pouco mais. Depois, já no verão de 2020, falei com ele ao telefone e fiquei muito confiante, pois estabelecemos logo uma relação de enorme honestidade e dedicação.  


M.I. - Como foi feita a gravação? Exatamente como nos outros álbuns ou houve alguma mudança por causa da pandemia? 

Pedro - Cada produtor e cada estúdio tem os seus caminhos e coisas. Claro, também há muitas coisas iguais (computador, monitores, equipamentos). A pandemia não fez muita diferença, além de não podermos ir ao pub nas primeiras duas semanas. Os Orgone Studios foram perfeitos para Hermitage. São no meio do nada, mas perto o suficiente de pequenas aldeias, numa bela região onde ele abriu a sua casa para nós. Todas as noites preparávamos o jantar e bebíamos vinho. O Gomez é colombiano, muito britânico hoje em dia, e culturalmente está mais próximo dos portugueses do que da maioria dos europeus do centro e do norte (com quem se dá muito bem). O Tue Madsen também é um produtor que se tornou nosso amigo pessoal. Por isso, não é a primeira vez. Mas é estranho, porque sinto que conheço o Gomez há anos. Posso definitivamente relacioná-lo com pessoas que conheço aqui! 


M.I. - “Hermitage” é como um novo começo, desta vez de isolamento. Por que é que este é um ótimo “conceito”? Agora que “The Butterfly Effect” foi relançado, o mundo parece estar a passar por um efeito borboleta. Nunca pensamos que passaríamos por algo assim... este infortúnio foi uma inspiração para vocês de alguma forma? 

Pedro - Não sei se é um bom conceito! Sei que é melhor do que o niilismo em que todos vivemos. “Butterfly Effect”, “Extinct”, “Night Eternal”, “Alpha Noir”, essas são as águas escuras por onde os Moonspell navegam! 


M.I. - A capa é bastante explícita, linda e incorpora todo o “conceito” do álbum! Quem a desenhou? 

Pedro - Desta vez optamos por uma mensagem gráfica mais clara! O Fernando fez toda a produção da arte e do produto final. A capa e as imagens embutidas foram pintadas (acho que posso realmente dizer isso) pelo Arthur Berzinsh. O design de montagem foi feito pelo João Diogo que trabalhou connosco no nosso lançamento anterior e na maioria dos relançamentos como o “Butterfly Effect”. 


M.I. - De acordo com o Fernando, este álbum será “muito mais maduro no que diz respeito à escrita das letras e da música”. O que significa exatamente? 

Pedro - Este não é um álbum para crianças e não vem de crianças, com certeza. “I love slow, slow but deep” cantavam os Dead Can Dance na música “The Ubiquitous Mr. Lovegrove” do álbum “Into The Labyrinth”... Chegamos a uma idade em que temos de ser honestos connosco mesmos. Podemos não saber o que queremos, mas agora temos certeza do que não queremos! 


M.I. – Os Moonspell separaram-se do Mike Gaspar e este é o primeiro álbum com o novo baterista. Quanto é que a formação afetou a banda? Como está a química entre os membros? 

Pedro - É um pouco prematuro avaliar sobre o quanto e como as relações dentro dos Moonspell mudaram, pois estamos não só perante esta mudança interna, como também perante esta catástrofe externa, que condiciona todo o normal funcionamento de qualquer banda. Mudou alguma coisa entre nós? Claro. Mas ainda não consigo dizer o quê neste âmbito da interação e relações.


M.I. - Depois de “The Greater Good” e “Common Prayers”, “All or Nothing” é o terceiro dos quatro vídeos que vão lançar antes da data oficial de lançamento. Qual será o 4º? 

Pedro - “Hermitsaints”, uma música mais pesada para deleite dos metaleiros! Tem muitas influências de Bathory. 


M.I. - A banda fez um concerto no Halloween e já tocou ao vivo com as regras do distanciamento social... quão diferentes foram estes concertos quando comparados com um concerto normal? Algumas bandas dizem que preferem fazer concertos assim do que não fazer, concordam? 

Pedro - Para mim não há nada a concordar. É o que é. Eu tocaria para as pessoas na cama se essa fosse a regra (não estou a ser perverso). O que eu prefiro é uma questão diferente, mas nós fizemos concertos com lugares sentados em 2020 e as pessoas pensam da mesma maneira. A diferença é que nós, como banda e, em última análise, o público, não recebemos esse feedback de emoções e acaba por ser um pouco frio. Mas assim também pode ser porreiro, porque as pessoas estão mais envolvidas no concerto. Os seus sentidos estão focados e a banda tem que tocar a música muito bem! 


M.I. - Vocês fizeram longas tournées para promover “1755” e, além de grandes músicos de estúdio, a banda é considerada uma das melhores ao vivo. Mas agora as coisas não parecem boas para tournées... quais são os planos? Como será feita a promoção de “Hermitage”? 

Pedro - Entrevistas, como esta. Criação de conteúdos para posse ou partilha em redes sociais. Concertos secretos (cumprindo as normas legais). Streamings. E mais tarde ou mais cedo, voltaremos à estrada.


M.I. - Hermitage também está disponível em cassete. Este formato estava quase morto e agora está de volta. Em alguns formatos, o álbum inclui “Darkness in Paradise” (cover dos Candlemass) e “The Great Leap Forward” para atrair mais pessoas. Nesta era de streaming digital, faz sentido ter cassetes e vinil? Quem os compra? 

Hugo - Surpreendentemente, ainda existem muitas pessoas apaixonadas que amam aqueles formatos mais antigos que se pensava que estavam perdidos há anos. Pode ser por vários motivos, nostalgia ou apenas por ser e soar tão diferente da era digital em que vivemos agora. Além disso, os colecionadores são outro tipo frequente de compradores desses formatos mais antigos. A cópia física pode durar para sempre se for devidamente cuidada, enquanto a cópia digital não pode. O streaming é muito conveniente, mas também pode criar uma certa insegurança porque precisa de ligação à Internet como suplemento. Outra desvantagem é que as corporações de streaming controlam-no, e, se quiserem encerrar o serviço, podem. Streaming é o maior formato agora e, infelizmente, é o formato em que os artistas são mais “roubados”, no que diz respeito ao pagamento desses serviços. No final de contas, acho que a cópia física veio para ficar, mesmo que seja uma porção muito menor do mercado. 


M.I. - Há uma publicação na vossa página do Facebook a dizer que o “Principal compositor, multi-instrumentista e co-empresário dos Moonspell inaugurará uma série de perguntas e respostas exclusivamente no clube de fãs Wolfpack, desenvolvido pelo Patreon”… esta é uma ideia para vos ajudar a lidar com o vírus enquanto não podem estar ativos ao vivo? Como é que as pessoas aceitam isso? Há muito pessoal a aderir? 

Pedro - O Wolfpack é o nosso clube de fãs organizado, com acesso exclusivo a Merch (algum oferecido, mesmo), aos músicos, a ante-estreias e a conteúdos como concertos ao vivo (gravados profissionalmente), playthroughs de instrumentos,  leituras sobre os temas que abordamos (podcasts) e muito mais. Quem subscreve pode pagar entre 3€ e 50€, tendo mais ou menos benefícios conforme o estatuto escolhido. 
Este projeto enquadra-se num contexto de pandemia e numa forma de alimentar a banda, mas era também algo que queríamos fazer - ter uma plataforma nossa e para os nossos. Ainda vai ser premiado como o melhor Patreon de bandas, vão ver!… 
Não vamos desistir sem lutar! 


M.I. - No comunicado de imprensa, o Fernando disse: “Sabemos que estamos a entrar nos anos finais da nossa carreira como músicos: o inverno da nossa vida. Não nos importamos com as pessoas que dizem que ainda somos jovens no coração, ou que "lideramos" lobos numa matilha. Não nos importamos! Mas importamo-nos com o que aqueles ao nosso redor sentem sobre nós, e este álbum é sobre como nos sentimos, as nossas respostas às suas perguntas.” Isto não é muito negativo? Vocês ainda são tão jovens! Muitas bandas tocam até terem 60 e tal anos... 

Pedro - Cada um de nós tem uma atitude diferente perante o processo de envelhecimento. O Fernando aceita-o e abraça-o. É o melhor… 
Eu ainda me sinto perfeitamente apto para enfrentar mais uns anos, mas penso muito sobre isso e, se outras bandas mais velhas continuam a “abanar o capacete”, apenas contribui um pouquinho para a forma como vemos o futuro. 
O som dos Moonspell reflete a nossa atitude. O Nick Cave, quando era jovem, lançou um álbum brilhante como o “Let love in” e, mais velho, o “Boatman’s Call” – uma autêntica obra de arte!


M.I. – Os Moonspell estão a aproximar-se do seu 30º aniversário como banda... qual é a lição mais importante que aprenderam nestas 3 décadas? 

Pedro - Pessoalmente, aprendi que não existe receita perfeita para ganhar a vida. Do México a Marrocos, da Finlândia a Espanha, há sempre seres humanos interessantes e inteligentes que me mantêm ligado à vida. E há uma quantidade enorme de informações que aprendemos ao longo destas décadas, que se tornou difícil concentrarmo-nos em apenas uma! Tenho a certeza de que o cliché “arte é 10% talento e 90% trabalho duro” foi uma das lições que aprendemos! 


M.I. – A banda está a fazer o relançamento de álbuns mais antigos pela Alma Mater Book & Records. São remasterizados ou lançados como os originais? Esses álbuns foram agora melhor recebidos pela comunidade do metal? 

Pedro - Quando possível, quando ainda existe uma versão não masterizada, sim, existe uma remasterização de verdade. Mas, por exemplo, para “Memorial”, embora tenhamos pesquisado profundamente, não encontramos nada além da versão final masterizada. Havia pouco a fazer, normalmente equilibrar o eq com o padrão de vinil. O álbum, até agora, mais apreciado entre esses relançamentos foi a nossa ovelha negra “Butterfly Fx”. Estou entre as pessoas que gostam de vinil e entendo totalmente porque os álbuns mais estranhos para a comunidade são mais apreciados entre esse pessoal! Normalmente, eles são mais abertos a limites e gostos musicais mais amplos quando comparados aos fãs “normais”. No geral, as pessoas adoram esses relançamentos! Eu também! 


M.I. – “Wolfheart”, “Irreligious”, “Sin / Pecado” são considerados verdadeiras obras de arte do dark / gothic metal e são os responsáveis por dar forma ao género nos seus estágios iniciais. Como é saber que influenciaram o género metal? Saber que os Moonspell são a influência de alguém? 

Pedro - É ótimo! Parece que alcançamos um dos nossos objetivos principais quando entrei nos Moonspell - ter um culto, não um sucesso! 


M.I. - No início, os Moonspell eram adorados fora de Portugal mas demorou um pouco até serem reconhecidos como uma verdadeira banda de metal no seu próprio país. Como se sentiram? Quão doloroso é ter que provar o vosso valor ao vosso próprio povo? 

Pedro - Uma vez, em 1996, tocámos numa sala em Lisboa, uma canção, nos principais prémios de música da revista e enquanto arrumava os meus teclados disse a um dos técnicos de produção que costumo fazer alguma coisa relativamente aos monitores, não me lembro o quê, e enquanto me ajudava dizia com amargura - “ah sim, o estrangeiro é melhor, né?”. Nunca entendi porque nós, portugueses, amamos o que vem de fora e odiamos o nosso! Sou português e os meus colegas também. E os técnicos portugueses estão no topo da lista mundial! Por que havia tantas pessoas na defensiva em relação ao nosso “sucesso” estrangeiro? 
Hoje em dia é bem melhor. Aprendemos que a partilha de informações é muito mais progressiva e desenvolvida do que guardar pequenos segredos e manter o status quo. 
Tínhamos os fãs connosco e isso era o mais importante, e tornou tudo mais fácil. Para mim, foi mais difícil quando provamos ser o que somos, há cerca de 10 anos, e os média não consideraram os Moonspell o ato mais internacional vindo de Portugal. Não apenas não fomos reconhecidos, mas também fomos desprezados - como o enorme elefante branco na sala que todos fingem não notar. Não precisas de gostar da nossa música, podes até desprezar o metal, mas é um facto que somos portugueses, existimos e somos a banda mais internacional que este país alguma vez teve. 


M.I. - Na vossa opinião, como está a cena do metal em Portugal atualmente? Melhor do que quando começaram? Agora, os fãs de metal e a sociedade em geral têm a mente mais aberta e há muitas bandas. Citem alguns artistas portugueses a quem a cena do metal deveria prestar mais atenção. 

Hugo - Bom, independentemente da pandemia, a cena Metal em Portugal é muito forte. Temos muitas bandas boas e muitos concertos e festivais de todos os formatos e tamanhos. Acho que o Metal em Portugal tem evoluído muito e tem estado muito saudável nos últimos 10+ anos. Nos anos 80 e 90, as opções eram muito mais limitadas em relação a locais, estúdios e tecnologia em geral. Hoje em dia, uma banda pode ter um álbum com uma ótima sonoridade por muito menos dinheiro do que há 25 anos ou mais. Com a evolução da tecnologia, as gravações estão muito melhores e pode obter-se muito mais exposição na internet do que antigamente. Claro, há sempre um lado negativo, que cria um mercado saturado muito maior e torna-se mais difícil para as novas bandas. Algumas bandas portuguesas a que as pessoas deveriam prestar mais atenção são os Gaerea, Kandia, Sullen, e claro que existem mais bandas, mas estas foram apenas as que vieram à cabeça. 


M.I. - Quanto é que o corona virus afetou os Moonspell, sendo uma banda que vive da música? Vocês têm um plano B, caso o vírus permaneça mais tempo do que os especialistas previram? 

Pedro - O mais difícil é não poder tocar ao vivo e estar com os nossos fãs. Isso é de longe o mais difícil! O ano passado não foi mau financeiramente, porque gerimos a banda de uma forma que temos uma rede de segurança. Além disso, foi um ano de álbum significando que poderíamos ganhar dinheiro com a sua produção e fizemos alguns concertos. Se esta situação se prolongar mais do que o esperado, aí sim, estaremos em apuros, mas não é muito dramático. Os Moonspell têm um plano B, mas eu prefiro dizer que são as nossas habilidades de adaptação. Elas foram sempre a nossa melhor característica como banda! Além disso, pessoalmente, acredito que tenho outras habilidades além da música. Enquanto for saudável, posso fazer muitos trabalhos. 


M.I. - Com o confinamento, o cancelamento de tournées e festivais, toda a indústria da música foi afetada… depois de tudo isto, quem vai “sobreviver”? 

Hugo - As bandas que mais, provavelmente, conseguirão sobreviver são as bandas maiores e mais consagradas. Como já possuem uma boa quantidade de fãs, podem encontrar novas formas de apoio por parte dos seus seguidores. Por exemplo, os fãs podem comprar mercadorias e outros bens que essas bandas podem lançar. Claro, agora mais do que nunca, as bandas precisam de ser criativas, por causa da falta de concertos ao vivo. Existem também ótimos sites como o Patreon que podem ser um grande fator para apoiar os artistas. É ótimo para criar conteúdo exclusivo para quem está disposto a pagar para apoiar as suas bandas favoritas. Como mencionado antes, também temos a nossa página WolfPack no Patreon. 


M.I. - Se compararmos os Moonspell agora aos Moonspell de “Wolfheart”, quais seriam as maiores diferenças? 

Hugo - Já que estamos a falar de um período de 25 anos, tem sido uma diferença enorme e óbvia. Como mencionado anteriormente, o mercado e a tecnologia evoluíram tanto em 25 anos que, obviamente, influenciam os diversos aspetos de qualquer banda. As canções ao longo destes anos evoluíram não só sonora, mas também estilistica, lirica, tecnicamente e com maturidade. Os Moonspell também são aquele tipo de banda que não segue apenas uma fórmula ou som. Qualquer pessoa que conheça minimamente a banda sabe disso, e acho que isso sempre se espera dos nossos fãs. Uma das características mais fortes dos Moonspell é exatamente isso. Como disse, não é a fórmula do tipo “toca e repete” que algumas bandas têm. Nunca se sabe exatamente o que está para vir. É esse fator surpresa que torna os Moonspell tão especiais, bem-sucedidos e ainda relevantes hoje, após quase 30 anos de existência. 


M.I. - E quão diferentes são os fãs de Moonspell agora em comparação com os fãs dos anos 90? Acham que ainda são os mesmos? 

Hugo - Conforme o nosso som evoluiu ao longo dos anos, mais fãs surgiram com ele. Obviamente, é impossível agradar a todos, e isso cria uma espécie de divisão. Com isso quero dizer que existem fãs que ainda preferem a era antiga de Moonspell, assim como fãs que preferem a era mais nova. Claro, ainda existem aqueles que realmente gostam e aceitam todas as eras. Além dos fãs mais novos, mais recentes, somos uma daquelas bandas que têm fãs fervorosos e dedicados que permaneceram connosco desde a era antiga até à nova e temos muita sorte nesse aspeto. Embora alguns discordem e se queixem de algumas das nossas escolhas musicais e sonoras, ainda permanecem connosco. 


M.I. - De todas as músicas que escreveram, digam-nos de qual têm mais orgulho e por quê? 

Pedro - Não tenho certeza sobre quem escreveu o quê. O Ricardo e eu escrevemos tantas coisas juntos, que costumo esquecer quem teve a ideia original. Então, vou responder como Moonspell e, nesse caso, terei que escolher entre mais de 100 músicas... “Future is Dark”, “Fireseason”, “Evento”, “Em Nome do Medo”, “Disappear Here”, “Mute” são realmente músicas das quais tenho muito orgulho, porque acho que realmente nos levam a outro lugar, além das notas e batidas. As minhas favoritas e das que mais me orgulho estão entre o álbum “Antidote” e “Hermitage”. Alguns dos arranjos que fiz, nem consigo acreditar que os fiz (como o entitlement B part). Talvez seja por isso que me deixam tão orgulhoso - porque sinto que já não são só meus! 


M.I. - Os Moonspell associaram-se ao movimento “A nossa música na rádio portuguesa” que conta com mais de 450 artistas portugueses que reivindicam o direito dos ouvintes ouvirem mais música portuguesa nas rádios nacionais. Não se sentem apoiados pelas estações de rádio? O que está a acontecer? Afinal, qual é a ideia deles? 

Pedro - Bem, há duas maneiras de abordar este assunto: a primeira é se as rádios são responsáveis ​​pelo que ouvimos ou somos nós os culpados por isso? As rádios privadas têm um papel social? A segunda questão é: já que as rádios obedecem a uma playlist patrocinada pelas editoras e agentes que representam os principais artistas (a chamada música comercial), por que não deveriam ser obrigadas a dedicar uma percentagem de tempo a artistas nacionais? 
É preciso entender que muitos artistas dependem, agora mais do que nunca, dos seus direitos de autor. Sem concertos, é compreensível e apropriado que os artistas tentem proteger e promover o seu trabalho o máximo que puderem. 


M.I. - Por favor, partilhem uma mensagem final com os nossos leitores! Muito obrigado pelo vosso precioso tempo e pela música incrível. 

Pedro - A nossa mensagem é a nossa música, por isso vou tentar o meu melhor: Apoiem os Moonspell! Somos a melhor banda de todos os tempos! Ah, e sejam simpáticos para as outras pessoas. Temos de viver uns com os outros, de qualquer maneira! Ouçam a nossa música, que é pelo menos melhor do que as minhas palavras! 

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Entrevista por Sónia Fonseca