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Entrevista aos Seventh Storm

Quando ninguém o previa, os Moonspell separaram-se do baterista Mike Gaspar. Apesar do Covid e todos os contratempos, o Mike conseguiu reunir forças e juntou um grupo de bons músicos formando os Seventh Storm. Passados dois anos da formação deste projeto, estão prestes a lançar “Maledictus” e têm todos os ingredientes para serem um tremendo sucesso! A Metal Imperium esteve à conversa com o Mike...
 
M.I. - Sensivelmente dois anos após a saída dos Moonspell, já tens um novo projeto com um novo álbum prestes a sair. Como é que te sentes?

Sim, nesta altura, já se passou algum tempo e é hora de refletir no tempo que passou e estivemos envolvidos em todo o processo e vivemos tudo com intensidade. Às vezes é difícil de descrever em toda a sua plenitude, tudo aquilo que senti, mas sem dúvida que não podia estar mais feliz e orgulhoso deste disco.


M.I. – Houve algum momento em que duvidaste da tua opção? Do rumo que tomaste?

Não é bem o caso, é a vida que nos manda para a frente e as situações que te aparecem... foi uma tempestade na minha vida na altura em que eu menos esperava, mas todos nós passamos por coisas assim. Tentei investir toda a minha energia, todo o meu foco num só projeto para me alimentar, para ter algo para dar continuidade à minha vida. Foram 30 anos sempre com vitórias, com lançamentos de discos, com atuações, uma pessoa até fica viciada. Tive uma vida muito intensa e, às vezes, até penso como fiz tudo o que fiz. Mas estou feliz por ter esta oportunidade e transformar uma coisa negativa em algo de espetacular.


M.I. – Este novo álbum faz-te sentir borboletas na barriga por causa do nervosismo e da emoção, como deves ter sentido nos primeiros lançamentos dos Moonspell?

Sem dúvida! Senti-me um adolescente outra vez! As reações das pessoas que seguem este estilo de música têm sido mesmo isso, dizem que esta música os levou de volta aos anos 90. Em 95/96, eu tinha 20 anos. Quem é que com 20 anos faz digressões mundiais e conhece lendas em todo o lado? Nem tive a oportunidade de apreciar por ser novo de mais e nem ter noção do que estava a acontecer. E, desta vez, tenho plena noção do que está a acontecer. E essas borboletas é que me dão vontade de subir ao palco, de tocar e de estar com as pessoas. É o que me dá energia mesmo que esteja desgastado e cansado, mas sabes que as pessoas estão ali para ti e tens de dar o teu melhor.


M.I. – Os Seventh Storm surgiram durante a pandemia, mas como é que se juntaram? Tu és o mentor da banda, é a banda do Mike... como te juntaste aos músicos que estão agora contigo?

Quem estava mesmo por trás deste projeto era o meu amigo Pedro Venâncio que tem um programa numa rádio em Cascais. Na altura, ele é que me pôs em contacto com 3 dos músicos. Foi uma altura em que eu pensei em desistir, por causa de tudo, da pandemia, por estar em Portugal, que é uma realidade muito diferente da Europa. Eu tenho músicos amigos, mas vivem todos na Finlândia, na Suécia, na Alemanha, mas não podia ir por esse lado, porque eu gostava de dar outra oportunidade aos músicos portugueses e para ter um projeto com tanta influência portuguesa, obviamente tinham de ser músicos portugueses! Eu nasci nos Estados Unidos, mas tenho tanto de americano como de português. Era importante ter esta ligação com músicos nacionais e, sem a ajuda deles, teria sido impossível porque tive de começar tudo do zero. Mas tinha muitos amigos com estúdios e prontos para ajudar e essa ajuda foi essencial na altura. O Rez foi diferente! Enviou-me uma mensagem a oferecer-se e eu não estava mesmo para lá virado. Estava concentrado na música, mas não sabia para que género me iria inclinar. Ele teve muita paciência e disse que estava lá e acreditava em qualquer coisa em que eu estivesse envolvido. Ele pôs-me completamente à vontade e, passadas 3 ou 4 semanas, vi um vídeo dele a fazer uma cover de Dio e fez-se um clique e pensei que não podia estar a perder tempo quando tinha um vocalista que se estava a disponibilizar para mim, com aquela qualidade de voz e aquela qualidade de dicção em inglês, sendo ele português... só de o ver percebi que ele tinha todos os elementos que eu procurava. Fomos beber um copo e tivemos uma conversa rápida de uma hora e, a partir daí, há cerca de dois anos, começamos logo a trabalhar. Depois houve as restrições e foi uma luta por causa dos horários em tínhamos de estar em casa e tudo o mais. Foi um processo muito intenso e de aprendizagem... também aprendi muito com eles.


M.I. – Estes músicos vêm todos de géneros musicais menos pesados. Como geriram isso?

O Ben é fã de música mais extrema, mas nunca teve oportunidade de ter bandas desse género. Mas, quando entramos em melodias mais pesadas, apercebi-me que com eles e com este projeto queria chegar a algo com o qual eu me sentisse confortável, algo de que eu me pudesse sentir orgulhoso e não esquecer o meu passado. Isso era muito importante, para além de querer fazer boa música, que era o mais importante para mim!


M.I. – Anunciaste a banda no dia 25 de abril de 2021. Porquê este dia em especial?

Acho que é um marco importante para Portugal, sem dúvida. Também aquela nostalgia e saudade do que é a liberdade. Hoje em dia, temos liberdade, mas, se calhar, já não lhe damos o valor que as pessoas davam antigamente. Também foi nessa altura que, naquele tempo, a música começou a ter mais força e começaram a acontecer eventos e concertos.


M.I. – O teu objetivo era trazer a emoção do metal dos anos 90 e misturá-lo com música tradicional portuguesa. Achas que foste bem-sucedido?

Até agora as reações têm sido espetaculares! Eu nunca esperei nada, ter já uma editora a este nível e esta promoção, principalmente estando a começar do zero, não queria tomar nada por garantido. Tenho visto algumas críticas e o que eu tenho notado mais é mesmo espanto. Às vezes até fico confuso a pensar como é que isto aconteceu?! (risos) Mas, a verdade é que, olhando para o passado, quando há uma energia, quando há uma vontade, quando há um sonho, com a minha história, não achamos que era impossível, mas não sabíamos se isto ia acontecer. Vendo agora os resultados só posso dizer que fiz o melhor que pude. Houve alturas em que houve fases mais intensas, em que tive de ser mais profissional e procurar os elementos que tive lá fora com os produtores que trabalhei, mas tive a essência portuguesa... já não gravava um disco em Portugal desde o início dos anos 90. Gravei na Alemanha, Suécia, Dinamarca e foi muito confortável ter só de ir até Lisboa e ter uma equipa à minha volta, que fomos criando, que me deu imensa confiança. Uma produção destas não acontece todos os dias, fomos fazendo aos poucos, aos fins de semana. Gravei a bateria toda num dia, o vocalista também gravou 4 músicas num dia, depois fizemos dois dias a mais para outros pormenores... e eu chamava a isto tudo uma demo, que era a melhor apresentação que as bandas underground poderiam ter quando estavam a começar. Nunca imaginei a minha demo tornar-se já no álbum lançado pela Atomic Fire que faz parte da Warner Music. Acho que à primeira não foi assim tão mau! (risos)


M.I. – Pois não! Mas também tens noção que pode também ter sido pelo facto de seres um músico tão aclamado, tão conhecido...

Pois, mas acho que isso acontece mais com um vocalista ou um guitarrista! O baterista está sempre lá trás! Eu digo muitas vezes que a música pode ser a melhor do mundo, mas se não tiver a distribuição certa, a hora certa, às vezes também se perde. Nota-se com tantos génios ao longo da vida que só depois de falecerem é que a gente dá valor! Quando duas coisas combinam: a música e a promoção, como no caso da Atomic que tem 30 anos de experiência, com a Nuclear Blast, com uma enorme carteira de bandas metal, só posso estar orgulhoso por estar junto a eles. E depois é a simpatia com que eles trabalham e a vontade. Eles são grandes fãs deste género musical e acho que isso ajuda imenso. Para além de serem pessoas com muito reconhecimento.


M.I. – E este contrato com a Atomic Fire como surgiu? Vocês enviaram demos para editoras ou foram eles que vos contactaram?

Eu tinha mesmo necessidade de tentar ter 3 músicas gravadas o mais profissionalmente possível e desde o início, o Thomas um produtor dinamarquês disse que me ia ajudar, alugou-me o estúdio. E depois ainda tive de mudar de chapéu... de baterista para manager! Tive duas semanas em que não conseguia dormir por causa da angústia de enviar as demos para amigos e a angústia de ver as respostas. E essas primeiras duas semanas pareceram dois anos! (Risos) E já estava a pensar que se calhar ia ter que colocar a demo no Spotify sozinho... há bandas assim... que só conseguem contrato após dez anos de carreira, depois de já terem um público. Mas aqui não foi o caso. O Esa dos Amorphis sugeriu-me o Markus da Atomic. Ele é uma pessoa que se mantém junto às bandas, acompanha o processo. Há promotores que vão assinando bandas, mas depois não lhes dão apoio. E eu não queria estar numa realidade dessas. Ele recebeu a demo no dia 13 de setembro, mal a ouviu, em menos de 24 horas, mandou-me um email às oito da manhã... as minhas manhãs mudaram muito, porque com os horários alemães a gente faz mais tudo de manhã, o que é otimo, porque consegues despachar muita coisa. Quando eu vi quem era, fiquei extremamente excitado. Passados dois dias de confirmar com a equipa dele, mandou e-mail a dizer que queria assinar. Ele tem uma carteira incrível com Opeth, Helloween, Meshuggah, e eu estava a ver como é que esta banda ia encaixar ali no meio disto tudo.


M.I. – Ou seja, anos em que estivemos em pandemia, em que te aconteceu algo inesperado, sair de uma banda, tinha tudo para correr mal, mas correu maravilhosamente bem. É tipo um renascer para ti, não?

É o mesmo símbolo que trabalhei... o S e o 7... a numerologia à volta da banda é um pouco isso, o renascer, a vontade de encontrar a espiritualidade, voltar à natureza. Eu queria pôr isso no projeto para simbolizar águas mais calmas, mas as letras tiveram de ser as mais bruscas possível. E esse contraste está todo no disco. Já há uma calma e sinto que as coisas estão a seguir o seu rumo e sinto que isso também foi importante para haver um pouco de calma aqui em casa. (risos)

M.I. – (Risos) Portanto a capa do álbum retrata bem esse turbilhão de emoções...

Sim, sim, sem dúvida! Na altura eu andava a correr muito na praia... a praia da Parede quando o sol está a nascer tem uma vista maravilhosa! E depois tenho todas as viagens da minha vida, todas as histórias... e foi toda a minha vida assim e Portugal historicamente tem ligação ao mar. Este álbum tenta mostrar as capacidades desta banda portuguesa e não esquecer o nosso passado e ultrapassar estes mares revoltados.


M.I. – Tu que já alcançaste tanto como músico, que pretendes alcançar com os Seventh Storm?

O primeiro álbum de uma banda às vezes define a carreira. Para mim, o auge já está a acontecer porque o que eu queria era mostrar a minha música e agora estou ansioso por estar perto do público em breve... de uma forma mais calma, mas essa é a melhor parte para mim, que é estar em contacto com as pessoas.


M.I. – Os vossos singles “Saudade” e “Haunted Sea” têm tido reações fenomenais. A reação dos fãs tem sido o que esperavas?

A razão disto existir são os amigos e os fãs que não me deixaram baixar os braços. Foi como um divórcio, ficamos todos a perder uma coisa que fez parte da nossa vida. Só que, no meu caso, foram milhares de pessoas que estavam habituadas a ver-me a tocar ao vivo e foi um pouco mais complicado. E as reações são fruto disso, mas o apoio esteve lá sempre. A comunidade metaleira une-se muito. Neste disco tentei ao máximo algo que acusticamente nos trouxesse de volta à música. E a versão acústica de “Saudade” foi mesmo a pensar nesses momentos.


M.I. – Se o Mike de hoje pudesse dar um conselho ao Mike de há 30 anos, o que lhe diria?

Ui! Ele foi sempre muito nervoso e tímido, parecia um bebé num corpo de homem. O que lhe dizia é que nós passamos pela vida e não levamos nada. Eu não ia conseguir ser a pessoa que sou agora naquela altura porque era demasiado inocente. Para mim era bateria, estar com a banda, ver a música, ensaiar. Eu já tinha tudo o que me fazia feliz. Mesmo hoje eu podia ter optado por fazer outra coisa, já com uma carreira longa, acho que não tinha nada para provar a ninguém dada a nossa história de banda portuguesas, sempre fui estando fora, mas era a realidade. Eu adorava que Portugal fosse na Finlândia, porque as bandas eram todas conhecidas lás. Eu tenho um grupo de amigos com filhos que estão loucos com o que nos está a acontecer. E eles diziam “Então agora não tens banda, Mike?” e estas crianças incentivaram-me a continuar. O melhor é não deixar de acreditar em ti, e temos de nos apoiar. Nesta fase eu tive sorte, porque tive muita gente a puxar por mim.


M.I. – Ficaste emocionado por isso?

Não imaginava mesmo! Depois são as histórias... pessoal que esteve comigo nos concertos e me vem dizer isto... ah e tal eu pedi-te as baquetas e tal...


M.I. – Por acaso, eu sou uma dessas pessoas. Encontramo-nos em vários concertos e, numa das vezes, eu pedi-te as baquetas e tu deste-mas!

Vês, lá está! Tiveste sorte! Não dão para todos! (risos)


M.I. – Muito obrigado pelo teu tempo e que os Seventh Storm tenham muita sorte, muitos concertos e espero falar contigo sobre outros álbuns que venham por aí!

Isto é apenas o começo!


M.I. – Queres deixar alguma mensagem para os teus fãs e leitores da Metal Imperium?

É só um agradecimento profundo a todos que nos dão força, a nossa família, os amigos, por esta segunda oportunidade. Como digo sempre, apenas dei o meu melhor e estão todos comigo! Obrigado!

Ouvir Seventh Storm, no Spotify

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Entrevista por Sónia Fonseca