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Reportagem: 1º Dia - Evil Live 2025: Judas Priest, Triptykon, Municipal Waste, Death Angel e R.A.M.P. @ Estádio do Restelo - 27.06.2025



O Evil Live regressou para mais uma edição, desta vez na sua versão Open Air, no Estádio do Restelo. Neste primeiro dia - ligeiramente mais curto que os restantes - esperavam-se grandes nomes da música pesada, atravessando várias variantes do Metal. Em destaque, os míticos Judas Priest como cabeça de cartaz.

E não havia melhor forma de dar início ao dia - encabeçado por um gigante do Metal mundial - do que com um gigante do Metal nacional: os incontornáveis R.A.M.P.! Antes da hora marcada, já se ouviam guitarras a rasgar a atmosfera quente de Belém ao som de “Blind Enchantment”. Mal se suspeitava que tudo ainda iria aquecer mais. Com energia puramente lusitana e uma musicalidade admirável, os R.A.M.P. mostraram, uma vez mais, porque são um dos grandes nomes da cena nacional. “How” inundou todo o estádio e colocou os já presentes a cantarem o refrão de forma automática. Rui Duarte evocou bem alto ‘Portugal será sempre number 1” e arrancaram assim para “The Number One”. Ainda durante esta malha, seria possível testemunhar um momento lindo de pura magia sinergética entre baixista e guitarrista num frente a frente. 
O facto de estarem quase 40ºC ao Sol não impediu uns devotos de permanecerem junto das grades, e de uns outros tantos darem o início à época de Circle Pit. Em “Insane” Rui Duarte refrescou o calor sentido, com cerveja para o público, no entanto a insanidade dos metaleiros não podia ser refrescada, pois já tinha atingido o ponto sem retorno. Houve tempo para Crowd Surfing e para mais uns clássicos como “For Those We Cannot Blame” e “Hallelujah” ambas com dedicatórias inscritas.  
Fecharam com “Drop Down", e numa atuação no mínimo formidável, deram o mote perfeito, não só para o dia, mas para todo o festival. 

Seguiram-se os Death Angel, que abriram com “Mistress of Pain”. O Pit formou-se de imediato, num autêntico manual de Classic Thrash Metal. A plateia, agora mais preenchida, devolvia essa energia em dobro. “Voracious Souls” trouxe um mega Circle Pit, libertação perfeita para as frustrações acumuladas de uma semana de trabalho. No final, ecoava o nome da banda em uníssono: “Death Angel”! “I Came for Blood” e “Buried Alive” intensificaram a festa. A banda pedia mais Circle Pit, e os metaleiros do Restelo não se fizeram rogados.

Em palco, foi deixado claro o entusiasmo pela estreia no festival. O público respondeu com entusiasmo, especialmente em “The Moth”, que levou todos ao delírio. Mas o auge surgiu com “Thrown To The Wolves”, onde a comunhão entre banda e plateia atingiu o absoluto. A ligação entre os metaleiros em cima e fora do palco era tão natural que só nos vinha à mente a imagem da Capela Sistina, quando os dedos de Adão tocam os de Deus, tal foi a intensidade do momento. E sim, se o dicionário tivesse uma definição para “acordo”, seria este.

Thrash Metal nunca cansa, e mesmo com o calor, o público do Evil queria mais. E esse “mais” já espreitava ao virar do relógio.


Às 18h em ponto, soava “Garbage Stomp” e de imediato o baixo rasgava com “Sadistic Magician”. A loucura instalou-se como um tsunami, o refrão berrado em uníssono. Melhor arranque de concerto do festival até então (e ainda faltava muita música). Crossover Thrash do melhor, dispararam à velocidade da luz quase 20 bujardas em menos de uma hora: genuína intensidade! “Slime and Punishement”, “Breathe Grease”, “Grave Dive”, “You’re Cut Off”, “The Thrashin’ of the Christ” e “Poison the Preacher” foram tocadas com uma robustez gigante pela banda; e da parte do público o Mosh Pit nunca parou, nem se quer abrandou com os inúmeros banhos de cerveja que insistiam em voar durante todo o show. Caos é uma palavra que ilustra apenas uma ínfima parcela do que foi esse concerto! A outra palavra é Crowd-Surfing e nada melhor que “Wave of Death” para isso mesmo. Contaram-se 30 pessoas a surfar... e depois perdeu-se a conta, ainda a música ia a meio (e tem apenas dois minutos!).
O apogeu foi em “Blackout Stage” com bolas de praia e noodles de espuma de natação a serem oferecidos aos festivaleiros.  “Under the Waste Command” serviu para agradecimento e “I Want to Kill the President” para critica política. Nesta última podemos ouvi-la em 3 versões (original, ainda mais rápida a la Napalm Death, e lenta a la Doom). Os Municipal Waste deram o concerto mais alegre e festivo do primeiro dia do Evil Live. A sua potência, entrega e habilidade de manter a festa durante quase 60 minutos é fenomenal, fazendo jus às malhas com que fecharam a sua exibição no festival: “The Art of Partying” e “Born To Party”. Tendo sido tocado “Demoralizer” ainda entre essas. A banda conseguiu gerar o maior circle pit do festival. Fake news à parte o quinteto da Virginia de facto nasceu para festejar (e esta afirmação não precisa de poligrafo). Termina o gig e ficam gravadas, na pedra das nossas mentes, as palavras ‘Municipal Waste is Gonna F$#& You Up!’.

Os Triptykon subiram ao palco e era projetado o quadro de H.R. Giger, “Satan I”, que muitos reconhecem como a capa do 2º álbum de Celtic Frost “To Mega Therion”. E com isto sabia-se que iriam ocorrer laivos da segunda banda de Tom G. Warrior. E nada verdade foi uma mistura estequiométrica perfeita, entre sons de Triptykon e Celtic Frost.

Começaram com “Goetia”, que mergulhou o estádio numa atmosfera densa e gélida, hipnotizante. Só os icónicos ‘Uhh!’ de Tom G. Warrior nos despertaram. “Circle of Tyrants” levou-nos à terra da melancolia e por lá ficámos, até que o setlist surpreendeu. “Tree of Suffocating Souls” e “Altar of Deceit” foram executadas de forma majestosa. A primeira trouxe um desespero doomico com uma batida ritmicamente confusa que, paradoxalmente, nos conduzia à salvação. A segunda, mais densa, trouxe distorção, lodo e um solo que se destacou entre todos. Voltaram a Celtic Frost com “Ground” e “A Dying God Coming Into Human Flesh”, recebidos com respeito absoluto, qualquer que fosse a malha.. Porque verdade seja dita tudo o que Tom G. Warrior tenha colocado as suas células cinzentas de pura criatividade, o resultado foi sempre brilhante.
Com “Aurorae” veio novo momento introspectivo, envolto numa sonoridade ultra atmosférica. E o desfecho veio com “Dethroned Emperor”, onde o espírito de Celtic Frost foi ressuscitado pelo seu próprio criador. Dito seja: com duas guitarras, o impacto da faixa é mais que duplicado. Fecharam com “The Prolonging”, e ao sair, a banda deixou “Winter” a tocar.

Tom G. Warrior, em todas as suas interações, revelou uma humildade rara. Génio é pouco para descrever quem criou três bandas de culto e ainda escolheu, com precisão cirúrgica, o alinhamento desta atuação. A arquitetura do concerto foi desenhada com detalhe quase microscópico: sem picos forçados, sem repetições. Uma cadência magnética guiava-nos música após música. Perfeito.
 

“War Pigs”, dos Black Sabbath, começou a ecoar pelas colunas do Estádio do Restelo. Para quem seguia a tour, era claro: o momento mais aguardado da noite estava a chegar. ‘‘Twisting the strangle grip won’t give no mercy’, começava “All Guns Blazing” e o estádio uniu-se num só coro. Sem pausas, seguiu-se “Hell Patrol”, também cantada em peso. “You’ve Got Another Thing Coming” foi mais um hino bem recebido pelos metaleiros. Estavam feitas as apresentações, ainda que os Deuses do Heavy Metal não precisassem de qualquer introdução. A tour celebrava os 35 anos do lendário Painkiller, e disso resultaram sete temas do icónico álbum de 1990 no alinhamento da noite. “Breaking the Law” foi um dos grandes momentos, um hino absoluto que fez vibrar todos os presentes para lá da sua frequência de ressonância. Rob Halford, Andy Sneap e Richie Faulkner alinharam-se lado a lado, partilhando riffs e fraternidade, enquanto o estádio gritava o refrão. “Touch of Evil” e “Nightcrawler” foram igualmente aclamadas.

Quando a intro de “Painkiller” irrompeu pelas colunas, o estádio explodiu. Arrepios, vozes no limite e um sprint final vocal, mesmo para os mais exaustos. Rob Halford fez soar o seu timbre com precisão, desencadeando uma descarga hormonal coletiva de pura felicidade. Uns imortalizaram com telemóveis. Outros, mais old school, gravaram tudo no hipocampo.

A reta final chegou com um encore de luxo: “Electric Eye”, “Hell Bent for Leather” e “Living After Midnight”. Todas vividas como se fossem a última, todas tocadas com energia renovada. Em “Hell Bent for Leather”, a mítica entrada de Halford em cima da mota selou o momento. E “Living After Midnight” encerrou em apoteose, um verdadeiro hino que foi cantado como tal. A despedida de Halford foi simples: “We are Judas Fu%&#ng Priest!”

Os Judas Priest são um nome que nos vem à cabeça sempre que falamos em Metal, é incontornável e é uma das bandas mais influentes e mais importantes, na história da música. Mostraram que idade é apenas um número, e que não os reprime ou deprime de modo algum. Aliás, a idade nestes senhores parece ter o mesmo efeito que tem sobre o vinho. Foi uma noite linda, memorável e que transformou muita gente em adolescente durante aqueles 90 minutos, onde foram tocados 17 músicas. Viagens ao passado ao som de música nostálgica, e olhando para o palco víamos 5 colossos, que pareciam mais vivos do que nunca. Terminaram e todos levaram estas palavras para o resto da vida: ‘Memento Vivere’.

De barriguinha cheia, os metaleiros paulatinamente, abandonavam (temporariamente) o Estádio do Restelo. Ainda faltavam dois dias de festival, contudo, este início foi uma descarga sonora, que iria manter muitos em completo êxtase durante diversos dias adiante. No segundo dia eram esperados também grande nomes, e com eles, mais pessoas. 


Texto por Marco Santos Candeias
Fotografia por Paulo Jorge Tavares
Agradecimentos: Prime Artists