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Entrevista aos Enthroned


Vinte anos de carreira são um marco importante na vida de qualquer banda… os belgas Enthroned estão prestes a editar o seu décimo álbum “Sovereigns” que promete mostrar que o Black Metal é um grande estilo e não precisa de ser noruguês para ser mesmo puro e bom. Nornagest teve uma animada e interessante conversa com a Metal Imperium.


M.I. – Deixa-me começar por perguntar se é estranho os Enthroned ainda existirem vistos já não terem nenhum dos membros fundadores? A verdadeira essência da banda ainda está viva?

A essência dos Enthroned estava “defeituosa” há alguns anos e tivemos de tomar decisões drásticas para a recuperar e endireitar. Estas escolhas não agradaram aos fãs mas quem são eles para dizer o que devemos ou não fazer no que respeita à sobrevivência da banda? Como já disse muitas vezes sobre este tema: as pessoas que têm um problema com isto são pessoas que nem conhecemos, portanto, porquê preocuparmo-nos? Mesmo o Sabathan, o anterior vocalista, concordou que era para o melhor… por isso, eu acho que as pessoas que mais importam são as que compõem as músicas e as letras e não aquelas que estão na ribalta por causa da imagem. É a verdade lógica e pura.


M.I. – Sois fãs de um grande leque de artistas e variedade musical… acreditas que há bons e maus estilos? Inspirais-vos em outros géneros para escrever a música dos Enthroned?

A meu ver, há dois tipos de música: a que eu gosto e a que não gosto. Eu não ligo nenhuma ao estilo ou ao género. Se gosto, gosto e pronto! Geralmente aprecio cenas mais obscuras mas não me limito só para não ferir susceptibilidades. Por norma, um músico é sempre influenciado, mesmo que inconscientemente, pelo que ouve. Com os Enthroned eu distancio-me das influências de Black Metal e Death Metal e deixo os meus sentimentos fazerem o trabalho. O género clássico tem-me influenciado muito mais nestes últimos anos do que o Black Metal.


M.I. – Os Enthroned são como o vinho… quanto mais velhos, melhor! Acreditas que a idade e maturidade mental juntamente com experiências de vida resultam neste álbum de metal extremo e brutal?

Acho que sim. Os últimos quatro álbuns são o fruto de experiências pessoais de todos estes anos de prática. O facto de eu ter imposto regras nos Enthroned também pode ser a chave: exijo pura honestidade, sentimentos verdadeiros, crença e fé e não quero ninguém aqui a fingir ser outra pessoa qualquer. Se os fãs não gostam, é melhor ouvirem outras bandas. Prefiro ser assim do que ser mais um entre milhares que usam o satanismo e o ocultismo como uma imagem para alcançarem o que pretendem.


M.I. – Vocês estão prestes a lançar o décimo álbum e celebraram o 20º aniversário da banda no ano passado… são marcos importantes! Esperavam que a banda tivesse uma vida tão longa?

Para ser sincero, nunca me questionei sobre isso. Vivo o dia a dia no que diz respeito aos Enthroned. Não quero analisar e pensar muito sobre o futuro, pois nunca é bom já que traz muitas perguntas sem interesse e desnecessárias… só importa pensar nas perguntas certas e no que interessa e tal só é possível quando tens uma visão pausada e pensada.


M.I. – A banda explora uma grande variedade de temas e estruturas dentro do Black metal. Os vossos álbuns são como uma continuação no que concerne a direção e temas usados. Durante quanto tempo conseguireis escrever este “livro”? Quando esse tempo acabar, será a morte dos Enthroned?

Exactamente, no dia em que eu não tiver mais nada para dizer, desistirei. Seria estúpido continuar só por continuar especialmente quando forças ideias que não sentes, seria mesmo estúpido assim como deixar-me influenciar… não pretendo mesmo começar uma carreira de prostituto. Estou orgulhoso de tudo o que fiz, aprendi com os meus erros e nunca fui prostituto e nunca o serei!


M.I. – O novo álbum tem nove temas. Qual a mensagem?

Cada salmo é visto de um ponto de vista de 8 entidades (podes chamar-lhes demónios), as letras são baseadas na experiência pessoal de cada entidade, informação credível, etc… estes seres são Ipos, Machaloth, Azraël, Buer, Haagenti, Zagan, Botis e Phenex. A primeira faixa é o prelúdio de tudo isto.


M.I. – A capa foi desenhada pela banda? Fala-nos sobre toda a informação e detalhes nela presentes…

Desde 2008 que somos nós que tratamos de tudo que esteja relacionado com os Enthroned, excepto as cenas que têm a ver com a editora, claro. Temos o nosso estúdio de gravação onde gravamos tudo. É o Phorgath que produz, mistura e masteriza os álbuns, eu e o Neraath tratamos das capas, desenhos e mercadoria… o Neerath é que pintou a capa e usou técnicas e elementos antigos. A capa está directamente relacionada com o conceito do álbum, cada figura representa um dos demónios de que falei anteriormente. Alguns detalhes ligam bem entre si e também com as situações descritas nas letras.


M.I.- Este álbum recebeu a melhor das pontuações em algumas críticas e tal raramente acontece… como te sentiste?

Claro que é excelente e senti uma mistura de orgulho e satisfação.


M.I. – O álbum “Obsidium” foi muito aclamado pelos fãs e pelos média… quão difícil é superá-lo? Pensais nesses termos… em melhorar a cada álbum que passa?

Não pensamos nessa perspectiva em fazer melhor do que no anterior, tem a ver com o modo como as coisas correm e como as pessoas as vêem.


M.I. – Por norma vocês não fazem vídeos promocionais… não achas que os vídeos poderiam contribuir para aumentar a vossa base de fãs?

Provavelmente mas eu nunca fui fã de vídeos de Black metal… a razão principal por nunca o termos feito prende-se com o facto de não ter surgido oportunidade nem o timing certo e nós não queremos fazer algo ridículo, tal como quase todos os vídeos. Posso dizer que estamos a trabalhar em algo para uma faixa do novo álbum mas porque as ideias certas surgiram na altura certa com uma perspectiva interessante. Os vídeos podem ser muito bons mas têm de ser bem feitos e essa é a principal dificuldade no Black Metal.


M.I. – “Sovereigns” será o segundo álbum a ser lançado pela Agonia Records. Como é que as coisas estão a correr?

Está tudo a correr bem, eles mantiveram todas as suas promessas e tiveram a ideia do boxset que está espectacular… temos de esperar para ver como correrá a colaboração daqui para a frente mas, neste momento, estamos satisfeitos e não temos motivos para mudar.


M.I. – Antes de lançarem “Pentagrammatron”, vocês assinaram com a Regain por eles vos terem oferecido um bom contrato, apesar da Napalm ainda estar interessada na banda. No entanto, após um álbum, assinaste com a Agonia… porquê?

Porque a Regain ficou falida, não sei bem o que se passou porque tal nunca foi devidamente explicado às bandas. O que sabemos é que um dia recebemos um email a dizer que eles iam suspender as actividades durante um tempo e que não podiam apoiar as bandas a 100%. Inicialmente pensei que se referiam somente a nós e a mais algumas bandas mas depois falei com o Morgan dos Marduk e o Infernus dos Gorgoroth e eles disseram-me que tinham recebido o mesmo email e que a Regain tinha acabado, portanto procuramos uma nova editora. Tivemos ofertas de grandes editoras mas a Agonia Records deu-nos o que queríamos, mesmo sendo uma editora pequena preferimos assinar com eles por estarem dispostos a apoiar-nos e a respeitaram os nossos compromissos.


M.I. – Já resolveste tudo com a Blackend? Qual foi a tua primeira reacção e pensamento quando te apercebeste que eles iam reeditar os vossos álbuns sem o vosso consentimento?

Não me parece que alguma vez as coisas fiquem bem ou resolvidas com a Blackend. A minha reacção? Fiquei, fico e ficarei furioso com esta cena, porque simplesmente não se pode editar material de uma banda sem a sua autorização… fazer dinheiro à custa dos fãs e da banda ao editar versões foleiras e antigas cheias de erros, sem determinadas faixas… é tramado. Se querem editar material têm de pedir permissão e fazer algo original e diferente que valha a pena, com as letras e informações correctas. A lista é interminável… nunca se edita uma merda como a que a Blackend editou.


M.I. – Os Enthroned vão tocar pela primeira vez no Chile em breve com os Goat Torment da Bélgica e os Kythrone do Chile! Estais entusiasmados?

Bem, vamos ver… hoje recebemos a notícia de que o concerto pode ser cancelado por falta de apoio dos organizadores locais, etc… Os tipos dos Kythrone estão a fazer o melhor para que nós e os Goat Torment toquemos lá mas é cada vez mais difícil levar bandas internacionais a tocar lá. Esperamos que tudo se resolva e que o concerto aconteça mas tenho um mau pressentimento.


M.I. – A banda vai estar muito activa… preferes tocar em festivais ou salas mais pequenas? Cartazes só com bandas de black metal ou bandas de vários géneros?

Pessoalmente, prefiro que as bandas do cartaz tenham um elo de ligação tipo Black/Death ou até thrash mas a ideia geral tem de ser a mesma, porque detesto ser incluído em cartazes festivaleiros com bandas de Hardcore, Nu metal, Metal core, funny/ gore grind… não tenho nada contra eles mas os nossos estilos não são compatíveis. Gosto de festivais mas só se tocarmos à noite… 


M.I. – Quão difícil é manter o estilo de vida?

Nem sempre é fácil por causa de todas as obrigações da vida, como o emprego, etc… mas ter uma família que te apoia também é uma ajuda muito preciosa. Para além disso, tudo é bom mesmo com todas as obrigações que temos… o meu estilo de vida assenta-me que nem uma luva!


M.I. – Como te sentes por saberes que há promotores que tentam ganhar dinheiro fácil a roubar as bandas e os fãs?

É uma parte da vida, claro que me irrita, tal como 99% da humanidade me irrita, por causa da estupidez mas tem havido gente desta desde o início dos tempos e sempre haverá.


M.I. – Li uma entrevista em que afirmas ter fãs muito dedicados em Portugal. Planeais voltar cá em breve?

É possível, espero mesmo que sim.


M.I. – Os Enthroned já andaram em tournée com os Corpus Christii de Portugal.  Estás familiarizado com a cena metal portuguesa?

O nosso baterista, Menthor, é de Portugal e dantes tocava com os Corpus Christii. Portanto há algumas bandas que conheço ou aprecio tais como Corpus Christii, Morte Incandescante, Decayed, Flagellum Dei, Storm legion, A Tree of Signs, Göatfukk…


M.I. – Como é a cena metal na Bélgica?

Para um país tão pequeno há um grande número de boas bandas, também bandas que não prestam mas não quero estar aqui a publicitar. Convém destacar Emptiness, Goat Torment, Possession, Paragon Impure, Verloren (rip), LVTN, Cult of Erinyes, The Reckoning, Absolutus, Dehuman, Gae Bolga, Slaughter Messiah,  Amen Ra, Lugubrum, Grimfaugr, e a lista continua…



M.I. – Onde encontras as audiências mais entusiastas?


Na América Central e do Sul, Rússia, País de Gales e capitais como Paris e Londres.


M.I. – Parece que apreciais mais os fãs americanos do que os europeus. Porquê? Quais as diferenças entre a América (Norte, Central e Sul) e a Europa?

Eles são mais dedicados. Um concerto não é um espectáculo de moda onde o pessoal vai só para criticar a roupa, o calçado e o cabelo dos outros. Eles não pagam um bilhete para ficar a beber cerveja no carro a ouvir CDs sem sequer entrar na sala!


M.I – Qual foi o concerto que mais te marcou?

Não sei… estou em dúvida entre aquele em que um gajo se suicidou no palco enquanto tocávamos “Radiance of Mordacity” ou um em Belo Horizonte em 2004 em que havia um moshpit com cerca de 2500 maníacos que estavam lá para nos ver, tendo poupado dinheiro durante o ano todo e nem comendo em alguns dias só para poderem estar lá… ou talvez os do México com a audiência mais brutal que já vi…

M.I. – Tens uma sala preferida?

Não.


M.I. – O Burzum tem atraído muita atenção para o Black Metal devido às suas ideias e acções extremas… alguma vez foste fã dele? Achas que isto teve algum tipo de impacto no género? Isto tem algo a ver com o facto de considerares que o BM passou uma fase ridícula?

O BM ainda tem uma face ridícula, talvez não seja uma fase mas sim uma face! De facto, o Vikernes teve um impacto na cena, tenha sido pelo assassinato, pelas suas ideas de extrema direita/Nazis, etc… mas nunca me influenciou de maneira alguma excepto pelo facto de eu achar que alguns dos seus trabalhos estão entre os melhores de BM de sempre.


M.I. – Quão difícil foi ter sido apelidado de rip off simplesmente por não seres Noruguês? Achas que os média têm culpa pela falta de informação que publicam sobre bandas mais pequenas/underground?

Fomos mesmo? A sério? Esta é a primeira vez que ouço isto! (Risos) Há muitos anos houve quem tenha feito flyers de Enthroned sem consultar a nossa opinião e escreveu “Puro Black Metal Noruguês da Bélgica”… isto é mesmo ridículo! Recebemos ameaças de pessoal como o Hoest dos Taake mas eles perceberam logo quem era o responsável pelos flyers e a história acabou. Há idiotas em todo o lado…


M.I. – O Satanismo e Ocultismo são uma grande parte da tua vida. É fácil conciliar este gosto com a sociedade? É difícil arranjar emprego e concertos por causa disto?

É uma escolha e eu não descarto as minhas crenças e opiniões. Quanto a uma situação de trabalho em que tal pudesse ser abordado, eu simplesmente não abordaria, não por vergonha mas porque estou lá para trabalhar e não para partilhar opiniões e sentimentos pessoais. Somente falo com profundidade sobre este assunto com alguns amigos, o resto está nas minhas letras para quem acha que as compreende sem explicações…


M.I. – Caso tivesses de apresentar alguém ao som de Enthroned, qual o álbum que deveria ouvir em primeiro?

O último álbum porque é sempre esse o conselho que um músico dá. Não sou a pessoa mais indicada para responder objectivamente a essa questão! (Risos)


M.I. – Qual o teu tema preferido dos Enthroned?

“Vermin” e “The Edge of Agony” estão empatados, porque relatam acontecimentos importantes que tiveram um impacto profundo na minha vida. Eu não seria a mesma pessoa sem essas experiências e revivo-as sempre que toco estes temas.


M.I. – Li que esperavas dar a atenção e qualidade merecida ao tributo a Cernunnos. Ainda pensas nisso?

Sim, mas as pessoas da Blackend que têm os direitos sobre esse lançamento estão a dificultar as coisas. Também se passa o mesmo com a reedição em vinil que queremos fazer há anos, mas eles não nos dão os direitos, o material, etc… eles querem uma enorme quantia de dinheiro em troca! Já tentamos há vários anos, até tenho uma faixa nunca lançada com a voz do Cernunnos para o relançamento de “Regie Sathanas” mas não a vou lançar porque ela pertence a este álbum e a mais nenhum! Todas as editoras que queriam fazer  a reedição de “Regie Sathanas” e de outros álbuns que estavam na Blackend nos disseram que não o podiam fazer porque a Blackend ou quer muito dinheiro ou nem responde aos emails!


M.I. – Para além da banda, também tendes um estúdio de produção. Como é lidar com a música dos outros?

O Phorgath e o Neraath são os responsáveis pelo estúdio, eu só os ajudo quando posso. O Phorgath faz um trabalho impressionante na produção de bandas e todas ficam satisfeitas com o resultado… cada vez temos mais bandas internacionais a vir ao estúdio e isso é bom sinal.


M.I. – Acreditas que  a crise económica europeia está a afectar a música em geral?

Claro que sim… tem impacto em tudo, menos dinheiro para todos desde promotores, editoras, bandas, etc…


M.I – Respeito e abertura de espírito são importante na música?

Na minha opinião são pois evitam que te aborreças, que estagnes, que vejas as coisas de modo diferente mas também há limites a manter!


M.I. – Como te sentes por seres um modelo para alguns fãs? Esse facto tem peso nas decisões que tomas na tua vida?

A escolha é deles e não minha! É simultaneamente lisonjeador e aborrecido, é difícil de explicar… eu não sou o tipo de pessoa que gosta de ser o centro das atenções.


M.I – Este ano será marcado pelo regresso dos Emperor! Qual a tua opinião sobre as bandas que se reunem para tocar nos grandes festivais? 

Se for para os músicos canalizarem a sua energia e sentirem necessidade de o fazer por si mesmos, pelo prazer e não pelo dinheiro e pela fama, então apoio a 2000%. Se for por outras razões então é deprimente mesmo! A maior parte destes regressos são uma lástima mas há casos raros que surpreendem como os dos Archgoat e Beherit.


M.I. – E quanto ao facto de haver músicos que se juntam e formam os chamados supergrupos. O que achas de tudo isto: será pela excitação ou pelo dinheiro?

Não sei… participei numa banda chamada Unlocked até há algum tempo mas nunca foi lançado nenhum álbum porque não estávamos satisfeitos. A banda era constituída por membros dos Enthroned, Gorgoroth, Prostitute Disfigurement e Peter Huss dos Shining. Fizemo-lo pelo prazer pois éramos todos amigos mas acho que tal é raro. Acho que na maioria dos casos a ideia vem da editora e não dos músicos mas não posso afirmar com certeza!


M.I. – Se pudesses formar um supergrupo a teu gosto, mesmo com músicos que já deixaram este mundo, quem escolherias?

Wagner – Lemmy – Clive Burr – Jimi Hendrix – Robert Buras! E nem preciso de explicar! (Risos)


M.I. – És um misantropo?

Nem por isso mas não dou muita confiança nem sou muito extrovertido!


M.I. – Deixa uma mensagem final para os fãs portugueses que aguardam ansiosamente o vosso regresso ao nosso país! 

Obrigado pela entrevista e espero que os Enthroned tenham a oportunidade de tocar em Portugal em breve! Khep’r


Entrevista por Sónia Fonseca