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Entrevista aos Khalas



Os palestinianos Khalas são conhecidos pelo público português, essencialmente, pela sua última tour à qual se juntaram aos israelitas Orphaned Land. Nesta tour mostraram que a música está acima da política, da religião e dos conflitos. O seu último álbum, The Arabic Rock Orchestra, junta ao rock e ao metal os elementos característicos do médio oriente. A Metal Imperium falou com a banda, que nos esclareceu alguns aspectos acerca do seu trabalho. 


M.I. - Como foi o processo de concepção The Arabic Rock Orchestra? E qual o seu conceito?

The Arabic Rock Orchestra desenvolveu-se quando começamos, no ano de 1998, sendo que o nosso primeiro álbum foi constituído por composição e letras originais, com excepção da faixa de abertura “Enta Omri”, que foi uma homenagem à mais famosa cantora árabe de todos os tempos Um Kalthum. Com os anos começamos a trazer mais elementos árabes e do médio oriente para a banda, tais como: percussão, flauta, alaúde, e muitos mais que em conjunto evoluíram para algum tipo de movimento. Todo este trabalho foi da nossa autoria e de um fã, ao qual nos referimos como um membro da família, portanto, não tivemos ajuda de qualquer editora. 


M.I. - Uma das músicas do novo registo, Min al Share, tem a participação do grupo de hip-hop palestiniano DAM. Como surgiu a ideia de juntar estes géneros musicais tão diferentes?

Nós somos amigos dos DAM há anos, e partilhámos o palco juntos imensas vezes. Quando decidimos produzir o novo álbum, nós sabíamos que tínhamos de dar o próximo passo e gravar qualquer coisa juntos. Foi assim que nasceu “Min al Share”, tornando-se na primeira música árabe, rap e pesada que alguma vez foi gravada!


M.I. - Em várias fotos promocionais do novo álbum é possível observar dervishes rodopiantes. Qual a sua relação com o álbum? E de que maneira o sufismo (vertente do Islão) vos inspira?

Para além de sermos fãs da filosofia e da música desta forma espiritual do Islão, quando fizemos a faixa “Baddek Zaafi”, esta terminava com um ritmo sufista e um solo de flauta, a partir daqui soubemos que tínhamos de começar os nossos espectáculos com um dervishe rodopiante e não com a tradicional bailarina de dança do ventre, sendo que este factor viria a torna-se parte da nossa imagem. 


M.I. - Para além de cantarem em árabe, possuem várias covers de grandes nomes da música do médio oriente como Umm Kulthum ou Farid Al-Atrache. É vossa intenção trazer um pouco destas raízes orientais ao mundo do rock e do metal?  

Nós fizemo-lo como tributo à nossa grande cultura musical. A geração mais nova não presta atenção a este maravilhoso tesouro que está à frente dos seus olhos. Mas com os anos nós vamos crescendo e evoluindo musicalmente e começamos a apreciar o que possuímos. Nós recebemos muitas opiniões de fãs árabes, que nos agradecem por começarem a prestar atenção a estes clássicos árabes, o mesmo acontece com fãs de outras partes do mundo. Basicamente pegamos no rock e no metal ocidental e acrescentamos os nossos filtros do médio oriente. 


M.I. - De que modo esperam que o novo álbum seja recebido pelo público europeu?

Está a correr melhor do que esperávamos, pois a música é uma linguagem universal, e quanto o ritmo é certo, tu danças independentemente da língua em que está a música. Mesmo que cantar em inglês nos abrisse portas para um mercado maior, acreditamos que se o fizéssemos perdíamos grande parte da magia, e a maior prova disso é que os nossos espectáculos lá fora, onde a maioria do público não entende o árabe, assistem aos concertos apenas pela música, e isso é gratificante.



M.I. - Com toda a conjuntura instável do vosso país, como é formar um projecto musical na Palestina? Quais foram as maiores dificuldades que sentiram? 


Não é só a situação política que nos traz dificuldades, mas também a falta de um panorama da música rock. Quando começamos, em 1998, não existia uma “cena rock” na Palestina, nós não só tivemos de criar uma banda, como também tivemos de construir essa estrutura. Contudo, a música alternativa palestina está a evoluir cada vez mais depressa e actualmente existem bandas de grunge, reggae, electro e muito mais. Mas ainda não temos editoras ou promotoras de espectáculos, falta-nos estúdio apropriado, produtores profissionais e palcos que entendem as necessidades de uma banda de rock ou de metal.   


M.I. - Como surgiu a oportunidade da banda participar na tour dos israelitas Orphaned Land? Podem-nos falar um pouco sobre essa experiência?

Os rapazes de Orphaned Land são extraordinários, nós somos seus amigos há anos. Eles têm uma grande banda de metal com uma grande mensagem e grandes letras e, por acaso, são israelitas. Mas nós não pensamos na nossa relação como israelitas e palestinianos, nós estamos muito mais além desses rótulos, nós somos irmãos do metal. Quando falo com o Kobi Farhi (vocalista dos Orphaned Land) não penso que estou a falar com o meu amigo israelita eu penso nele como o Kobi Farhi, o meu amigo e irmão. Nós sempre quisemos fazer uma tour juntos, mas não tínhamos oportunidade devido a problemas financeiros ou falta de tempo, mesmo esta tour esteve quase para ser cancelada no último minuto, até a nossa editora, MMGHQ, intervir e decidir financiar a nossa participação. O facto de estar num autocarro, fazer todas as noites um concerto ou passear em diferentes cidades por toda a Europa, todos os dias, foi uma experiência que não conseguimos descrever por palavras, mas a melhor parte foi conhecer e actuar para o maravilhoso público.


M.I. - Muitas vezes os media rotulam o povo árabe negativamente. Acham que através da música conseguem desmistificar essa imagem?

Definitivamente os árabes e os palestinianos são sempre rotulados pelos media negativamente como terroristas ou ignorantes ou uma merda dessas. Mas quando alguém procura informação credível sobre nós, rapidamente se apercebe que estamos muito longe da imagem que os filmes de Hollywood e das notícias que passam. Nós sabemos que o que fazemos é apenas uma gota no oceano, mas temos de começar por algum lado, não acham? 


Entrevista por Patrícia Torres