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Lothus Thief - "Oresteia" Review


Uma viagem poderá ser feita de variadas e diversas  formas, sendo que uma das mais interessantes é, sem sombra de dúvida, aquela em que a mente peregrina, onde o físico não alcança, num mundo introspectivo que só, fechando os olhos e deixando-se levar pela textura da música, é que se percebe. Dessa forma, os Lotus Thief, presenteiam-nos com uma agradável boleia pelas mais diversas formas de expressividades no metal.

Não detentora de  uma matriz austera e inflexível, "vagueando" entre um Black Metal imiscuído com um Gótico, ou até mesmo um post-Metal, tudo se torna tão estranho como concomitantemente interessante. Quando tudo se assenta numa sonoridade plácida, aos poucos se percebe de que estamos perante uma banda muito própria, não sendo sendo mais uma mera cópia como muitas o são, fazendo dessa forma, ainda que por vezes a razão não consegue atribuir uma justificação, que nos viciemos de forma gradual.

Motivo que nos cativa e que se evidencia logo à primeira é, sem dúvida, a voz, ternurenta e perceptível, pouca ou nenhuma estridência, sendo que subitamente se irrompe em guturais, fazendo que essa mescla torna a sonoridade singular, existente sempre em quase toda a totalidade do álbum a maior simplicidade possível, despojando qualquer forma de exagero em termos de arranjos, ainda que subsiste um primor em criar ambiências e atmosferas muito invulgares.

Os Lotus Thief, oriundos de S. Francisco,  não nos fascinam e deslumbram somente pela sua musicalidade, mas também há que ter em muita consideração do seu enredo literário como influência, e que de todo não a podemos descartar, ressaltando aqui nomes como Tolkien e Crowley. Para que as coisas não se reiterassem, a banda decide indagar desta vez na obra "Oresteia"  com base na morte, assassinato e queda de Agamemmon, sendo aqui a essencialmente base de inspiração, e caso queiramos fazer uma correlação com questões da actualidade, podemos suscitar uma diversidade de temáticas que por vezes nos consternam relacionados com justiça, sociedade, ou seja nada que não estejamos familiarizados. É de facto interessante como existe aqui uma ligação entre a literatura e um sentido crítico se associarmos ao temas que são tratados na obra e a aplicarmos nos dias actuais. Para os mais interessados e que realmente queiram aprofundar o álbum de fio a pavio, olhar para as letras sem ter em consideração a leitura da obra torna tudo um desafio, contudo, apenas lendo as sem haver uma interpretação ao cerne da questão, percebemos desde logo a subtileza e a capacidade de composição.

Ternurento e indecifrável no modo como são adornadas as suas composições, guitarras simplórias, acompanhadas de uma bateria que ampara toda melodia por detrás, havendo aqui, ainda que de forma muito exígua, a aparição de alguns blast beats.  Cósmico e com um certo ambientalismo, os vocais são mais uma vez citados como um dos pontos mais fundamentais a ser destacados. Não posta de parte é esta ambiência e atmosfera que envolve o álbum, ligando as faixas em si, não havendo uma ruptura abrupta, mas uma espécie de "cordão" que as une. Suave em todos os aspectos, fundamentalmente na forma como os instrumentos se dispõem, ainda que o baixo é uma inexistência. Mérito não desprezado e atribuído às guitarras que fazem aqui um trabalho significativo e, como estamos a falar de tragédia grega e um pouco da sua cultura, como os grandes filósofos disseram e muito bem, o meio termo é a mãe de todas as virtudes, ou seja, nem guitarra a mais nem a menos.

Difícil a escolha, mas a "Sister in Silence", contemplada pela crítica, mas pela positiva, como uma referência do que foi mencionado anteriormente, atraente no seu todo, com um inicio tão acirrante e atmosférica, com um peso mediano, mas que rapidamente é aquietado para uma brandura absoluta, passando progressivamente para outro,"The Kindly Ones", que primazia essencialmente no ambiente em que a vocalista se despede aos poucos, com um entrelaçados de vozes por trás. As restantes faixas, como o álbum no seu todo, exteriorizam o seu lado mais ambiental, de um longínquo incógnito, como se uma viagem se tratasse onde a voz predomina e acalenta os nossos ouvidos, asseverando de que a designação de conceptual aplica-se bastante bem, pois falamos de um álbum que baseado numa obra e, como reiterado anteriormente, suscita temas que muito bem se aplicam à nossa sociedade.

Não é a primeira vez e não será a última que uma banda tem como influência e inspiração a literatura, neste caso em concreto uma tragédia grega e, independentemente do seu tempo, trazê-la para a contemporaneidade é de todo saudável e, ao mesmo tempo, desafiante a forma como é construída toda a narrativa do álbum. Contudo, a não leitura da obra não veda a possibilidade de uma excelente audição deste lançamento, tendo aqui uma premissa a ter em conta, a singularidade da sonoridade dos Lotus Thief concomitantemente com literatura de um clássico torna-se tudo mais encantador e enigmático.

Nota: 7/10

Review por Norberto Seck