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Entrevista aos Cradle Of Filth


Os Cradle Of Filth, nome incontornável da cena metal Britânica, tiveram uma grande influência na evolução do Black Metal Sinfónico. O seu álbum de estreia “The Principle of Evil made flesh” foi aclamado como um dos melhores dentro do género e, a partir daí, têm vindo a lançar álbuns envoltos num misto de idolatria e polémica, principalmente por serem considerados demasiado comerciais. O décimo álbum da banda “The Manticore and other horrors” é mais um marco numa longa carreira. Dani Filth conversou com a Metal Imperium sobre os vinte anos no activo, o novo álbum, o envelhecimento e até sobre o seu desejo de... 


M.I. – O novo álbum tem o título “The Manticore and other horrors”… porquê a mantícora? Quem teve a ideia? 

A ideia foi minha! Deixa-me começar por dizer que este álbum não é essencialmente um álbum conceptual como os dois anteriores, “Darkly, Darkly Venus Aversa” e “Godspeed on the Devil’s Thunder”, este é mais uma colecção de histórias e daí o título. “Manticore” é o tema título do álbum e a faixa foi inspirada em imagens de bestas mitológicas. O álbum, no geral, lida com monstros, entidades místicas, personagens ficcionais. O tema “Manticore” foi escolhido como título porque fazia sentido, pelo menos para mim. E portanto decidimos entitular o álbum de “The Manticore and other horrors”, inspirando-nos na colecção de histórias de Edgar Allan Poe “The Raven and other stories”… foi como um tributo, mas este álbum é muito mais do que uma selecção de temas monstruosamente diferentes uns dos outros. 

M.I. – O álbum é sobre monstros… tens assim tantos monstros pessoais para exorcizar? 

Penso que todos temos de vez em quando! Todos temos dúvidas e pequenos medos… especialmente quando estamos parados há tanto tempo, especialmente na situação da banda, já que temos estado afastado dos espectáculos há algum tempo, surgem sempre dúvidas sobre a nossa actuação e capacidade… só que mal começamos uma nova tournée, verificamos que estar na estrada é muito parecido com andar de bicicleta porque nunca se esquece. Também nos questionámos se seremos capazes de escrever um novo álbum que supere os anteriores… por isso, penso que há sempre dúvidas. Estes temas lidam com demónios pessoais mas são essencialmente sobre superá-los, enfrentá-los…


M.I. – Como é que foi escrever um álbum “normal” após ter escrito dois álbuns conceptuais?

Eu não diria que é “normal”… (risos)


M.I. - Mas é fácil?

Eu não diria que é fácil, caso contrário toda a gente o faria, mas foi uma lufada de ar fresco. Eu não diria que é fácil mas é mais fácil. Num álbum conceptual, depois de teres as faixas ordenadas e completamente criadas, não podes simplesmente mudar a faixa um para faixa dez porque elas têm uma ordem cronológica que tem de ser respeitada para a história fazer sentido, pois é mais cinemática, é mais como ouvir a banda sonora de um filme. Foi muito bom ter a liberdade de escrever temas como as pessoais normais fazem (risos) e nesse aspecto foi uma lufada de ar fresco. Não queremos ser uma banda previsível pois isso limitar-nos-ia mas foi muito divertido escrever um monte de temas soltos. 


M.I. – Dizes que não queres ser previsível… achas que experimentar faz parte da evolução de uma banda?

Obviamente! Caso contrário as bandas fariam sempre o mesmo álbum uma e outra vez. Há bandas como os Bad Religion, que eu adoro, que têm o mesmo som de todas as vezes… eu aprecio isso e nem quero que mudem os ingredientes que usam para fazer novos álbuns mas penso que, no nosso caso, é bom evoluir e temos feito isso de uns álbuns para os outros… é evolução. Fazemos as coisas assim para manter os fãs interessados e, felizmente, por este motivo, não podes predizer o que faremos a seguir… penso, no entanto, que o nosso som desta vez não está assim tão diferente, é possível ouvir e perceber que são os Cradle Of Filth só que com um sabor e uma personalidade diferentes. 


M.I. – Não achas que foram estas alterações /experiências que fizeram com que muito pessoal deixasse de apreciar os COF? Muitos fãs do vosso som original nem sabem bem se são vossos fãs hoje em dia ou não!

Sim, isso é verdade para algumas pessoas mas também há aqueles que preferem e gostam dos COF de hoje em dia. Nós estamos a falar de 20 anos no activo e a banda mudou, quer quisessemos ou não, por isso há evolução. Este é o nosso décimo álbum  sem contar com os EPs, álbuns ao vivo, Best Of. A banda mudou e se tivessemos dez álbuns iguais, os fãs não apreciariam. Temos uma boa base de fãs mas eles também sabem ser implicativos e negativos quanto às mudanças mas isso é normal. A maior parte das bandas tem a ideia que deve soar sempre igual… é um conceito muito estranho! Quando eu era novo, gostava de uma banda se ela fosse muito obscura, mas se a banda se tornasse popular, eu deixava logo de gostar deles… mas depois cresci e amadureci! (risos)


M.I. – Não parece que passaram quase 20 anos desde que “The Principle of Evil Made Flesh” foi lançado, pois não?

Realmente não! Mas só em 2014 é que faz vinte anos do lançamento do álbum de estreia. No entanto, já faz vinte anos que criamos música…


M.I. – Voltando ao novo álbum, a mantícora é uma criatura legendária Persa que tem corpo de leão, cabeça humana com dentes afiados. A descrição não é tão bela como a representada na capa do vosso álbum!

É uma quimera, uma besta feita da junção de várias coisas, e nós interpretámo-la como a deusa da morte. Ela tem alguns dos atributos mas não todos. A minha história favorita da mantícora foi escrita no século XIX e envolve o Império Britânico e as províncias Indianas. Aconteceram cenas estranhas que os indianos atribuíram a um monstro horroroso e mítico. Apreciei bastante este atributo. 


M.I. – Sim, mas a mantícora da capa é bela... vocês apreciam mesmo exaltar a beleza do corpo feminino, não é? Afinal, os COF já usaram figuras femininas em capas de vários álbuns.

Como eu disse, depende da interpretação e personificação que cada um faz! Nós usamos a figura feminino como uma tela. É algo que se tornou sinónimo com a banda desde os primeiros tempos. É uma daquelas pequenas coisas que tornam a banda diferente, que marcam a diferença e que distingue a entidade que são os COF.


M.I. – Já estão disponíveis dois temas “For Your Vulgar Delectation” e “Manticore”… a resposta tem sido fenomenal mas dividida… penso que há mais pessoal a gostar de “Manticore”, talvez por lembrar os primeiros álbuns. Dirias que este é um álbum que vos leva de volta às origens?

Acho que sim… o facto do Paul Allender estar de novo na banda depois de ter estado afastado, fez com que ele trouxesse algum daquele velho sentimento de volta. Nos álbuns anteriores parecia que faltava qualquer coisa que já tínhamos tido… aqueles riffs hardcore, grind e punk voltaram mal ele começou a escrever! Não diria que foi algo consciente mas algo que ele achou que deveria introduzir pois fazia falta. O álbum é muito diferente e ele escolheu o primeiro tema “For Your Vulgar Delectation” e eu escolhi o segundo “Manticore”… foi uma escolha pessoal e as pessoas vão curtir o álbum porque ele tem vida própria, é uma entidade. O primeiro vídeo que fizemos foi para “Frost on her Pillow” e estará pronto muito em breve. Nunca estamos 100% satisfeitos com algo logo à primeira e é sempre preciso fazer pequenos retoques. Vamos aproveitar que toda a banda vai estar junta antes da tournée europeia para gravar outro vídeo  mas ainda estamos a decidir que tema deveremos gravar por isso não posso adiantar pormenores. 


M.I. – O vídeo de “Frost on her Pillow” será tão grandioso como os outros vídeos da banda?

Sim, claro que sim! Tem um lado muito fantasioso! Passámos dois dias num armazém velho a gravá-lo e eu escrevi sobre isso no meu blogue mas, neste momento, não me apetece muito expandir sobre isso porque estou muito cansado já que me tenho dedicado à promoção do álbum junto da imprensa (risos)… Mas a gravação correu muito bem e o vídeo está a ser ultimado. Penso que encaixará perfeitamente no catálogo de vídeos de COF. Somos muito cinemáticos e tentamos expressar e explorar visualmente esse lado.


M.I. – Alguns dos vossos vídeos no youtube têm milhares e milhares de visitas e a vossa página oficial no facebook tem mais de um milhão de “Gosto”. Alguma vez esperaste alcançar esta fama?

Sim, quando qualquer banda começa a sua atividade, a intenção é mesmo esta! Quando te imaginas a actuar, mesmo estando a sonhar, imaginas-te num palco enorme… é isso que desejas! Foi essa a ideia inicial e eu nunca concordei com o pessoal que diz que este género de música tem de ser underground, necro e não pode ser apreciado pelas massas… isso é treta! Penso que se deveria desejar que mais pessoal ouvisse este género musical! Por exemplo, o Stephen King e o Clive Barker são autores extremos com visões extremas e vendem milhões e milhões de livros…. Isto deveria passar-se com a música também. Na minha opinião, as pessoas podem ouvir e apreciar COF e apreciar também os The Prodigy. É uma onda diferente que origina sentimentos diferentes mas todos gostamos de cenas mais obscuras de vez em quando. Os COF são assim!


M.I. – A banda vai entrar em tournée no final do ano…

É já daqui a três semanas! (risos)


M.I. – O tempo passa mesmo a voar…

Eu estou ansiosamente a contar os dias…


M.I. – Estais a preparar um grande espectáculo, já que a vossa música é tão cinemática?

Nós somos cabeças de cartaz mas não é uma tournée nossa. É um pacote de bandas excelentes com Godseed, Rotting Christ, Blynd… fomos convidados para participar e aproveitamos mas não somos nós que tratamos das datas nem nada. Simplesmente vamos em tour com bandas com as quais temos grande afinidade.


M.I. – Fiquei muito triste quando soube que a data em Portugal tinha sido substituída por uma em Espanha, pois estava ansiosa por vos rever...

Eu sei! Não percebo porque é que isso aconteceu e passa-se o mesmo com França que é um país enorme. Lá faremos apenas um concerto enquanto, por norma, fazemos cinco ou seis. Vamos a Espanha e íamos a Portugal e agora não vamos…. Acontece o mesmo com a Bielorússia que fica no outro lado da Europa e cuja data foi substituída por duas na Rússia. Mas na nossa tournée vamos tentar visitar todos estes países que vão ficar de fora agora… Foi o promotor desta tournée que fez as alterações e nós não podemos fazer nada mas é só por agora… nós vamos voltar com grandes espectáculos e espero que o pessoal não os perca!


M.I. – Já agora, quem desenha as roupas que usais em palco e nas sessões fotográficas?

É um bocado de tudo… às vezes somos nós, outras vezes contratamos um estilista de roupas teatrais, tal como aconteceu para a gravação do último vídeo  Mas tentamos usar sempre alguém diferente para ter perspectivas diferentes… contudo, a ideia principal parte sempre de nós.


M.I. – Porque é que mudaste o teu aspecto para as fotos promocionais? Foi difícil reconhecer-te na peruca loira!

Exactamente… foi a estilista que teve a ideia de ser diferente e ter aspectos diferentes, baseados em criaturas mitológicas estilo Lord Of The Rings e Demonic. Nós fizemos as coisas assim para termos fotos originais e distintas das que costumamos ver…. Às vezes vejo fotos em que as bandas têm cinquenta poses iguais a cruzar os braços e isso é muito aborrecido. Foi muito divertido e nós somos crianças grandes que adoram mascarar-se!


M.I. - Já que estás prestes a ir em tournée… costumas enfrentar muitas tentações na estrada?

Às vezes, sim! O principal é não festejar demasiado porque estou demasiado velho para isso e também não andar tanto tempo seguido em tournée. Tento não beber antes dos concertos porque não há nada pior do que ter uma ressaca horrível e ter de actuar… também não é bom para os fãs porque ficam desapontados e a culpa é toda nossa. Costumamos beber nos dias em que não temos concertos. Hoje em dia já não cometemos tantas loucuras e com a idade e maturidade estamos mais profissionais.


M.I. - Disseste que estás a envelhecer e para o ano vais celebrar o teu 40º aniversário. A idade preocupa-te?

Penso que preocupa toda a gente, não? Quando és jovem, olhas para as pessoas com trinta anos e pensas “Que velho!” e agora quando chegas aos trinta ainda te sentes uma criança…. Penso que se passará o mesmo quando atingir os quarenta e eu não me sinto mais velho. Nós vamos ser sempre assim, nunca envelheceremos tal como o Peter Pan…. E ainda coleccionámos brinquedos. E se eu pensar bem, nunca tive um emprego a sério, se bem que fazer parte dos Cradle é como ter três ou quatro empregos em simultâneo. Depende, pergunta-me quando eu estiver prestes a fazer cinquenta porque agora eu penso “Ooh, isso será horrível” mas tenho a certeza que não será assim tão mau quando estiver a chegar lá!


M.I. - Na tua carreira, qual é o momento que mais apreciaste?

Não sei mesmo! Tem havido altos e baixos, tal como num casamento. Todos os álbuns têm os seus méritos e a música de cada álbum reflecte o que se passava nessa época, a estação do ano em que se estava…. Houve grandes momentos mas algumas desilusões como a banda se ter “partido” em metade quando perdemos o Nick Barker e o Lester. Vistas bem as coisas, foi para o melhor, para começarmos de novo. Passamos tanto tempo juntos e gostamos de estar juntos. Neste momento, é complicado porque o baterista é da República Checa, o baixista é da Escócia e a teclista é dos Estados Unidos e todos temos famílias  mas também quando estamos em tournée passamos demasiado tempo juntos e vivemos literalmente no colo uns dos outros dentro do autocarro. (risos)


M.I. - Já fizeste um pouco de tudo… lançaste o livro “The Gospel of Filth”, participaste no filme “Cradle of fear”, estás numa banda famosa... ainda há algo que te falte fazer?

Também escrevi um livro de poesia que ainda não lancei porque necessita de titulo e ilustração e ainda tenho de esperar pelo momento certo… o livro não vai a lado nenhum por isso pode esperar. Acho que a banda é muito mais do que uma banda, é um estilo de vida. Nós somos sortudos porque podemos dar-nos ao luxo de recusar algo que outras bandas não podem. Gostamos de alargar os nossos horizontes … por isso acho que ainda há algo que eu posso fazer. Gostava de desenhar a minha linha de roupa de praia… (risos)


M.I. – Costumas separar o Daniel Davey do Dani Filth ou estão misturados?

Acho que é inevitável haver mistura mas quando os fãs me conhecem na vida real ou fora do palco, eu não estou cheio de adrenalina e a cantar aos saltos e isso cria uma certa barreira, porque é diferente do que eles estão à espera. A minha casa é omo a casa da família Adams porque eu estou muito relacionado e ligado a toda a filosofia dos COF. Não é como se eu pusesse um fato para ir para o palco e o tirasse quando saio e vivesse numa grande casa branca, percebes? (risos) Tudo o que se relaciona com a banda me deixa fascinado e por isso é que tudo é tão divertido e é a razão pela qual conseguimos ser tão criativos… porque realmente vivemos isso! Há algumas diferenças em mim quando estou no palco, ou quando estou com a minha família mas é mesmo assim que tem de ser, não é?


M.I. – Como é ser pai de uma adolescente? Tentas afastá-la das luzes da ribalta?

(risos) É divertido mas eu não sou mandão e não imponho que ela acompanhe a banda ou cenas do género. Ela gosta do que as outras adolescentes gostam, ou seja, gosta dos One Direction, Jessie James e eu não a vou empurrar ou pressionar para nada. Os meus pais não fizeram isso comigo e eu também não vou fazer isso. O meu pai era coleccionador de discos de reggae e estava sempre a tocá-los. Tocou-os tantas vezes que eu me fartei e até hoje tenho dificuldade em gostar de reggae por causa disso. Portanto, acho que devemos deixar cada um seguir o seu próprio caminho!


M.I. – Mas não te incomoda que a tua filha não siga as tuas pisadas?

De maneira alguma! Não é ela que produz os meus álbuns!


M.I. – Como é que os teus pais reagiram quando formaste uma banda de metal?

Já nem me lembro correctamente mas acho que aceitaram bem. Eu já conheço a minha mulher há mais tempo do que formei os COF e nós fomos viver para um apartamento sozinhos antes de eu formar a banda, portanto os meus pais nem tiveram muito que dizer. Eles costumam vir ver-nos tocar de vez em quando e a minha mãe até me faz algumas das roupas. Somos bastante chegados!


M.I. – Qual é o teu maior medo?

O meu maior medo?! Normalidade! E detesto estar aborrecido e ter de aturar situações e pessoas aborrecidas… talvez o encarceramento também me enlouquecesse porque eu gosto de ter liberdade e de fazer o que quero quando me apetece, por isso…


M.I. - Bem Dani, agradeço o teu tempo e atenção. Últimas palavras!

Cheers! Vemo-nos na estrada!

Entrevista por Sónia Fonseca