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Entrevista aos Rotting Christ



Os Rotting Christ dispensam apresentações. Estes gregos já por cá andam há 30 anos e vieram a Portugal em início de fevereiro por causa da tournée “Rituals Amongst the Rotten European” com os Carach Angren e os Svart Crown. Antes do concerto no Hard Club, na Invicta, o Sakis esteve à conversa com a Metal Imperium...


M.I. - A banda já está em tournée há algumas semanas... como tem corrido?

Muito bem, na verdade, uma das melhores que já tivemos na nossa carreira até agora, tem uma combinação muito boa de bandas. As pessoas que nos vierem ver assistirão a um óptimo espectáculo de todas as bandas.


M.I. – Já conheciam as bandas que estão em tournée convosco?

Sim, sim, especialmente com Carach Angren.


M.I. - Como funcionam as coisas? Dão-se todos bem?

Sim, apesar de não ser muito fácil andar um mês a partilhar um autocarro com 20 pessoas, é habitual quando estamos em tournée.


M.I. - Como conseguem encontrar energia para estar em palco e tocar quase todas as noites... é quase como um treino diário intenso, não?

É muito difícil... porque eu já não sou jovem...


MI. - [Risos] Mas tu não és velho!

Bem, vamos encarar a realidade... Não sou velho, mas também não sou novo e preciso de conservar a minha energia. Por isso não bebo álcool e tento ter uma vida saudável, tomo multivitaminas durante a tournée. Tento fazer o meu melhor porque alguém pagou um bilhete para me ver, então eu quero fazer o meu melhor.


M.I. - Então nem vais beber vinho do Porto...

Ok, talvez um copo... mas não vou ficar bêbado! Porque, se ficar bêbado, não poderei tocar em Lisboa porque estarei doente amanhã!


M.I. - Estás na estrada por longos períodos de tempo... como consegues manter a voz?

Não sei! Todos me perguntam como eu mantenho a minha voz e eu não sei responder... vem naturalmente. Claro, procuro não me desgastar todas as noites, dantes costumava fazer isso, mas não funciona mais para mim. É por isso que estou aqui... não é para me divertir, mas para fazer o meu melhor!


M.I. - E divertires-te também ...

Mas mesmo assim fico nervoso porque não é fácil fazer isto todos os dias.


M.I. - A banda já existe há 30 anos... quão complicado foi chegar aqui?

É uma vida inteira, até dava para escrever um livro. Eu sacrifiquei muito na minha vida porque as coisas não são assim tão fáceis como pode parecer. As pessoas pensam que estar numa banda é muito fixe e que só vivemos momentos divertidos e felizes, mas não é assim. Acredita quando digo que sacrifiquei muitas coisas, mas também recebi algo em troca, porque se toco música e alguém diz “a tua música tocou-me" é essa a minha recompensa, é um prémio para mim. Eu gosto de conversar com pessoas de todo o mundo, mas através da música.


M.I. – A tua música é muito poderosa, por isso...

Algumas pessoas gostam, algumas pessoas não. Mas ter quem goste, é uma honra para mim.


M.I. - Como te mantens inspirado?

Hmmm, é muito difícil. Antes de mais, preciso de ter tempo livre.


M.I. – Tens emprego para além da banda?

Não, já não, mas estou a fazer quase tudo na banda, procuro inspiração quando tenho tempo livre... mas é muito difícil ter tempo livre. Penso muito e tento-me descobrir, tentando encontrar algo que nunca encontrei antes.


M.I. - Alguns podem achar estranho que escrevas música tão profunda e obscura quando estás rodeado por belas paisagens!

Sim, é lindo, mas não consigo escrever música quando estou feliz. Eu sou uma pessoa normal, penso eu. Acontece que eu me expresso melhor a escrever música. Não importa se sou da Grécia, da Rússia ou da Noruega... este é um país bonito, mas também há muitas pessoas deprimidas aqui. Não é muito fácil... o país é bom, mas as pessoas às vezes... acontece em toda parte, na Grécia, em Portugal...


M.I. - Porque somos dois países muito parecidos! Em Março, a Season of Mist lançará uma compilação de CD dupla com os vossos maiores sucessos. Quem escolheu as faixas? 

Fui eu e foi uma dor de cabeça, um pesadelo!


M.I. - Sozinho?

Sim, foi difícil. Eu tentei incluir todos os anos e os álbuns, todas as eras.


M.I. - Esta compilação inclui uma nova faixa "I will not serve". Por quê colocar uma nova faixa numa compilação de sucessos?

Sim, é uma faixa inédita e eu decidi colocá-la lá para tornar o lançamento mais interessante.


M.I. - Mas, sendo uma compilação de "best of", não parece fazer muito sentido...

Ahhhh, “best of”! Eu não gosto disso, mas depois de 30 anos acho que merecemos ter uma compilação como esta!


M.I. - Sim, sim, merecem! Mas, ao mesmo tempo, a Peaceville hoje lançou um EP para celebrar os vossos 30 anos de história.

É um 7" EP, é uma reedição com uma nova música "The call".


M.I. - Está bem! Mas nova mesmo ou nunca foi lançada?

Nunca foi lançada também. Sabe, eu pressionei-os para fazer o lançamento em formatos old school, como 7 "Eps, apenas vinil, como costumávamos dantes. Não fazemos isto pelo dinheiro, porque deves entender que 7" não dão dinheiro, simplesmente fazemos isto porque gostamos da ideia de ver as nossas músicas lançadas nesses formatos mais “antigos”.


M.I. - Algumas pessoas preferem esses formatos e as bandas lançam assim os álbuns porque sabem que os fãs os apreciam. Este 7" também inclui “In the sign of evil existence” com Nergal e Necroabyssus.

Sim, é uma música ao vivo que fizemos juntos na Polónia e o Nergal estava lá e juntou-se a nós em palco para tocar a música.


M.I. - Acredito que estas 2 faixas ajudarão a aumentar as vendas ...

Eu não penso assim, acho que só será mesmo comprado por quem ainda ouve vinil. 


M.I. - Muitos álbuns estão disponíveis on-line apenas alguns dias depois de serem lançados... isso afecta as vendas?

Sim, claro. Eu já nem me importo e até prefiro isso. No passado, na América do Sul, no Brasil, eles não podiam ouvir a nossa música e agora podem, basta pressionar um botão. Para mim, não é importante ganhar dinheiro com a música, é importante que alguém a ouça. Algumas pessoas acham isso estranho e pensam que sou estúpido, porque perdi muito dinheiro, mas não me importo, porque prefiro ouvir o que o meu instinto me diz... é algo que faço desde o primeiro dia da banda.


M.I. - O vídeo oficial para Societas Satanas acabou de ser lançado... é uma música com 22 anos dos Thou Art Lord... porquê esta faixa em particular?

Sim, sim! Porque é uma das melhores... é uma das músicas durante as quais os fãs reagem mais. Verás isso esta noite!


M.I. - Essa música é de uma banda grega e também fizeram cover de Aphrodite's Child "The Four Horsemen" e eles também são gregos. Por quê cobrir fazer cover de uma banda de rock?

Porque era um álbum influente e eu gosto da música. Sabes, às vezes, as pessoas perguntam por que não fazemos covers de Slayer, Iron Maiden, mas queremos fazer algo diferente. É óptimo encontrar músicas profundas em outros géneros musicais e tentar transformá-las em música de Rotting Christ.


M.I. - É um tema bonito e o vídeo também é excelente!

Obrigado! Tentamos ter vídeos com as letras, mesmo que sejam simples, mas apenas para que as pessoas leiam as letras e tenham uma ideia porque são muito importantes para mim. Algumas pessoas não gostam deste tipo de vídeos, mas são importantes para mim!


M.I. - Concordo. Eu gosto das tuas letras, mesmo não entendendo algumas delas. Gosto de "Devadevam" e, às vezes, vou ao tradutor do google para ter uma ideia do que se trata.

Sim! É bom, fizemos-te pesquisar e isso é bom! Vivemos num mundo onde muitas línguas são faladas e tentamos colocar um pouco de tudo. Não me importo que algumas pessoas não gostem de ouvir músicas que não estão em inglês!


M.I. - Eu gosto da melodia e a língua grega é bonita e, quando cantas, gosto muito!

Vamos cantar algumas hoje!


M.I. - Eu sei! Procurei a tracklist que andam a tocar nesta tournée...

Mas muda um pouco...


M.I. – E já ia perguntar sobre isso! A maioria das músicas desta tournée são dos álbuns mais recentes ou dos mais antigos... os álbuns do meio não recebem atenção!

Pois não!


M.I. - Porquê?

Porque sentimos que essa era não encaixa bem com a atmosfera actual da banda.


M.I. - Há uma música que tocam em todos os concertos, "The Forest of N'Gai". Porquê?

Sim, é do 1º álbum e é para os fãs mais antigos. Nós gostamos de incluir músicas da nossa primeira era porque achamos que foi uma era muito importante.


M.I. - A tournée chama-se “Rituals Amongst the Rotten European” mas só tocam 3 temas de Rituals.

Sim, mas tocamos 12 músicas no total e, se tocássemos mais desse álbum, muitos se queixariam porque queriam ouvir mais músicas de outros álbuns.


M.I. - Mas fizeram uma tournée para promover Rituals, certo?

Sim, visitámos todo o mundo, excepto a Austrália e Portugal.


M.I. - Ahhh! Os Rotting Christ são uma das poucas bandas que conseguem manter um line-up mais ou menos estável. Quão importante é trabalhar com as mesmas pessoas?

Para mim é muito importante, mas às vezes precisamos de mudar, porque nem todas as pessoas seguem os teus sonhos e eles não conseguem entender isso. Algumas pessoas não querem estar numa banda mais de 5 anos, querem continuar com as suas vidas e eu digo que está tudo bem, não há problema!


MI. – O Sakis e o Themis são irmãos... é difícil manter as coisas separadas?

É muito complicado! Sabe como é... mas é a pessoa em quem mais confio.


M.I. - A banda já tocou mais de 1250 vezes ao vivo...

Bem, 1500... a minha vida inteira foi em cima do palco.


M.I. - Tens memória de algum em especial?

Há muitos concertos que são mais especiais do que os outros. Já toquei em condições de guerra, na Ucrânia, na Sibéria, na Patagónia, em todo o mundo... cada concerto tem algo especial.


M.I. - E no Porto... o que é especial aqui?

Hoje sinto-me em casa. Não falamos o mesmo idioma, mas...


M.I. - Está frio, não é?

Sim, está frio, mas é Inverno! Mas sinto-me como se estivesse em casa e posso conversar com pessoas com mais facilidade porque os europeus do sul são diferentes dos europeus do norte! A mentalidade...


M.I. - Supostamente somos preguiçosos...

Eu não acho que sejamos preguiçosos... talvez as condições e as políticas de todo o sistema nos tornem preguiçosos. O sistema político dos últimos 15 anos é tão mau que estamos presos aqui. É o sistema que criamos. Quero mudar as coisas no meu país, quero fazer parte da solução!


M.I. – Vais candidatar-te a um cargo político?!

Não, não me quero envolver nessa situação. Sou uma pessoa muito honesta e não posso mentir às pessoas, porque se és político, tens de mentir!


M.I. – São todos mentirosos!

Sim, sim! Mas vou tentar mudar as coisas do meu ponto de vista.


M.I. - Mas como vais fazer isso?

Por exemplo, muitos jovens músicos perguntam-me como é que me tornei músico sem ajuda de ninguém, só por mim. Eu tento ajudar as pessoas com as minhas acções e digo-lhes que devem trabalhar e seguir os seus sonhos, eles devem dar tudo... eu digo-lhes isso, porque é o que eu realmente faço.


M.I. -  És como um modelo a seguir!

Eu sou uma pessoa normal, podes encontrar-me em qualquer lugar e este sou eu! Não quero fingir que sou especial porque não sou.


M.I. - Sente necessidade de passar a imagem de que és uma pessoa responsável em vez de entrar no palco e ficar bêbado e tal?

Sim, sou muito responsável e farei o meu melhor hoje. Vou tentar pelo menos!


M.I. - Já estão a preparar material novo?

Durante a tournée não, mas já estamos a tratar disso. É assim que eu fujo da vida, pensando.


M.I. - Se pudesses recuar no tempo, o que dirias ao Sakis há 30 anos?

Eu faria exatamente o mesmo.


M.I. – Em tudo?

Não tudo! Eu assinaria alguns contratos ou mudaria algumas coisas que fiz... nós aprendemos com os nossos erros e se tens mente aberta ...


M.I. - Esses erros tornam-se experiências e ficas mais sábio!

Mais sábio, é claro! A menos que sejas viciado em drogas ou álcool... então dizes adeus à vida!


M.I. - Somos pessoas e as nossas opiniões e sentimentos mudam com o tempo... Existe algo que disseste ou escreveste com não concordas hoje em dia? Que te tenhas arrependido de dizer ou fazer?

Hmm, às vezes arrependo-me, mas não muitas! Digo que não te deves arrepender do passado. Todos já fomos jovens e cometemos erros... às vezes arrependo-me, mas tento que tal não aconteça.


M.I. - Estareis bastante activos este ano com tournées...

Temos estado bastante activos nos últimos 5 anos! Mas eu gosto assim, não me queixo!


M.I. – Não ficas cansado?

Sim. Não vês as olheiras à volta dos meus olhos? Eu fico cansado porque toco e viajo todos os dias! Esta é a minha dedicação na vida, e tenho que fazer o meu melhor.


M.I. - São as viagens a pior parte da tournée?

Sim, sem dúvida. Se não fossem as viagens, seria perfeito. Se eu pudesse estalar seus dedos e aparecer em todos os lugares em que preciso de estar!


M.I. - Quanto é que a indústria da música e a cena underground mudaram desde que os Rotting Christ começaram?

Começamos com cassetes, fitas, sem pc, computadores, internet e agora estamos aqui. Eu já vi tudo, toda a evolução.


M.I. - Sentes falta da troca de cassetes e dos flyers no início dos anos 90?

Claro que sim. Os flyers, as cartas, as lendas, a comunicação, agora não há comunicação... não sei se é bom ou mau.


M.I. - Acho que é mau...

Agora sabe-se tudo, não há mistério e isso é muito importante para a imaginação. Agora tudo é bom de certa forma, mas não quero saber o que Bruce Dickinson está a fazer agora. Eu quero tê-lo como uma lenda, mas...


M.I. – Agora sabe-se tudo e, às vezes, até se sabe demais. Está tudo online.

É a vida. Big brother!


M.I. - É por isso volto sempre para as bandas que comecei a ouvir. Estas bandas mais novas não me atraem...

Eu sei o que queres dizer! Não tens tempo para acompanhar tudo, porque existem muitas bandas. Essa é a realidade. Se quiseres mudar o sistema, precisa de mudá-lo por dentro, começar de dentro. Esta é a minha solução! A música permanecerá, mas as pessoas não. Eu não quero ser glorioso, mas espero que a minha música permaneça por muitos anos.


M.I. - Desejo-te um óptimo concerto!

Espero não te desapontar. Farei o meu melhor!


MI. - Eu sei que vais fazer! Por favor, deixa algumas palavras aos leitores do Metal Imperium!

Mantenham o espírito e sempre Non Serviam!

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Entrevista por Sónia Fonseca