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Entrevista aos Destruction


A máquina do Thrash Metal da Alemanha, Destruction, está de volta com o seu 3.º álbum ao vivo. Aproveitámos esta oportunidade para falar com o lendário Schmier precisamente sobre este álbum. Toda a agressividade e brutalidade continuam bem presentes nos seus corações, mesmo depois de mais de 30 anos de carreira na indústria da música. É normal que acabemos por pensar que toda esta situação com a COVID-19 é um problema. No entanto, nem tudo é mau, porque agora temos “Born to Thrash – Live in Germany” para desfrutar. Eis o que Schmier teve a dizer sobre tudo isto.

M.I. – Olá Schmier, obrigado por nos concederes esta entrevista, é um grande privilégio podermos estar aqui a falar contigo. Como estás, tendo em conta que toda a gente está em quarentena devido à situação da COVID-19? Como estás a lidar com tudo isto?

Olá! Penso que a pior parte já está para trás. Tem sido horrível e o facto de que ninguém sabia como reagir foi um choque. Foi chocante a rapidez com que se alastrou, mas agora que temos estado de quarentena tem sido mais fácil. As pessoas não sabiam como lidar com a situação devido ao trabalho, aos filhos… mas penso agora que está tudo bem na Alemanha. É bom ver que estão a deixar as pessoas sair novamente, os restaurantes estão a abrir de novo, as lojas também, portanto, está tudo a voltar ao normal. Creio que podemos ver um pouco de luz ao fundo do túnel.


M.I. – Portanto, aproveitaram a oportunidade, agora que toda a gente está em casa, para levarem até aos fãs um espetáculo de Destruction. “Born to Thrash – Live in Germany” é o 1.º álbum ao vivo com a formação atual e o 3.º álbum ao vivo numa carreira com mais de 30 anos. A situação atual foi a principal razão para o lançamento deste álbum ou existe outro motivo? Como surgiu a ideia?

O único motivo prende-se mesmo com a situação da COVID-19. Gravámos o espetáculo do Partisan Festival do ano passado basicamente por acidente, porque um amigo meu, o nosso técnico de som, grava os espetáculos ao vivo. Ele gravou o Partisan Festival para outras bandas e, depois do espetáculo, fez-nos uma surpresa com as gravações. Basicamente, acabou por trocar as gravações por algumas bebidas. Verificámos o material e foi uma noite espetacular e um excelente espetáculo, mas não tínhamos intenções de o lançar. Em fevereiro, início de março, íamos começar as férias e eis que surge a COVID. Tudo foi adiado, foi o caos total. Eu estava de férias numa ilha, no meio do oceano Índico, sem poder viajar para a Alemanha e tive um daqueles momentos baixos em que tudo está mal e pensei “Ok, não temos trabalho, não posso viajar para casa, está tudo mal, o que vamos fazer?”. Lembro-me de dizer aos outros membros “Tendo em conta que temos de ficar em casa, que não temos trabalho, que não há festivais, que poderemos não ter espetáculos por um ano inteiro… que tal se lançássemos este álbum ao vivo?”. Queríamos lançar isto como álbum digital em primeiro, porque queríamos lançá-lo rapidamente. São necessários vários meses para produzir um álbum e o vinil. Por isso, queríamos lançá-lo de forma rápida e acho que acabou por ser um bom meio-termo. Estamos satisfeitos com o resultado, mas sim, não teríamos este álbum sem a COVID-19.


M.I. – O álbum é composto por 10 das mais notórias músicas da última digressão, juntando músicas do álbum “Born to Perish” com outros clássicos de Destruction. Alguns destes clássicos foram lançados há mais de 10 anos. Que diferenças podemos ouvir entre os clássicos mais antigos e as músicas de Born to Perish, por exemplo?

Não sei, entre o “Curse the Gods” e o “Born to Perish” acho que não há grandes diferenças. É um som de Destruction e é um bom sinal de que a banda conseguiu manter o seu estilo e criatividade. Por isso, as novas músicas entram basicamente no estilo característico de Destruction. Temos também 4 ou 5 novas músicas ao vivo, porque as pessoas reagiram bem ao novo álbum, e isso é ótimo de se ver, porque os clássicos serão sempre uma referência, as pessoas vão sempre querer ouvir os clássicos.


M.I. – Por falar em diferenças, Damir Eskic, o guitarrista de Gomorra, é a mais recente adição à formação da banda. Tivemos o prazer de falar com o Damir, devido ao facto de que os Gomorra estavam a lançar o seu primeiro álbum, tendo ele dito que estava ansioso por ir em digressão com os Destruction também. O que é que o Damir traz à banda como um todo e como é que se está a adaptar aos Destruction?

Temos feito uma seleção muito cuidadosa. Foram preciso muitos anos para finalmente recrutarmos um segundo guitarrista porque estávamos à espera da pessoa certa. E ele é simplesmente a pessoa certa porque, em primeiro de tudo, é um guitarrista fantástico, adora Destruction, adora Thrash, tem um bom currículo enquanto músico (estudou Música), é também um excelente guitarrista de solos – porque estávamos à procura de uma pessoa com boas competências na guitarra rítmica e nos solos – portanto, ele tem todas as competências, o que é algo muito raro. Normalmente, os guitarristas de solos não são tão competentes na guitarra rítmica e vice-versa. Além disso, é uma excelente pessoa, é muito engraçado, está sempre bem-disposto e trouxe isso para a banda. Quem me dera que tivéssemos pensado nele mais cedo, porque tivemos um excelente ano e acho que a banda está melhor do que nunca com ele.


M.I – Tu e o Mike estão na banda desde a sua conceção, mas o Randy Black foi outra adição à banda em anos recentes. Era este o sangue fresco de que os Destruction precisavam para continuar para os próximos anos? Consideras que estas eram as peças que faltavam no puzzle de Destruction?

Sabes, estar numa banda é um trabalho difícil, porque não é assim tão fácil manter o espírito e toda a gente motivada para isto e muitas pessoas mudam a sua vida… casam, têm filhos, novas prioridades, não podem estar sempre em digressão e têm de ganhar uma determinada quantidade de dinheiro para manter a família. Não há muito que se possa fazer em relação a isso. Mas o Randy é, na verdade, um bom amigo nisso, um dos meus bateristas favoritos desde que o vi em diferentes ocasiões e sempre gostei da sua forma de tocar bateria. Ele ajudou-nos numa digressão de verão quando o Vaaver não conseguiu comparecer por causa do nascimento do seu novo filho. Desde então, temos mantido o contacto e quando estávamos à procura de um baterista, o Randy estava disponível. É um baterista fantástico, há poucos como ele no mundo, é completamente profissional e é uma máquina nos espetáculos ao vivo. Estou muito feliz por tê-lo na banda. Além disso, nem todos têm a sorte de poder tocar com o seu baterista favorito, é fantástico!


M.I. – Ainda no assunto das diferenças, durante anos temos assistido a um longo debate sobre Thrash Metal americano vs. Thrash Metal alemão e tu pareces a pessoa ideal para responder a esta pergunta: na tua opinião, qual é a maior diferença entre o Thrash Metal americano e o Thrash Metal alemão?

Essa é muito fácil: o Thrash Metal alemão nunca se vendeu (risos). As bandas americanas têm mais sucesso porque optaram por uma via mais comercial. E digo isto com todo o respeito! Escolheram um caminho diferente, mas nós não. Nunca tentámos ser uma banda de rádio. Não fazemos música para meninas pequeninas, sabes. Fazemos música para homens selvagens que querem perder a cabeça, dar uns berros e desfrutar. Acho que essa é a maior diferença. As bandas europeias são mais agressivas e brutais e mantiveram-se assim, enquanto as bandas americanas escolheram a forma americana: fazer bom dinheiro; o dólar é uma parte importante do orgulho do capitalismo da América. Por isso, compreendo que a banda possa ter de perseguir essa via. Obviamente que todos querem ser bem-sucedidos, mas não me posso queixar: temos uma base de fãs sólida, viajámos pelo mundo fora… e olha para Kreator, são um nome cada vez maior. Penso que o Thrash está vivo e de boa de saúde.
Mas, sim, considero que as bandas americanas são excelentes, mas é essa a diferença. Além disso, se reparares na idade, essas bandas são um pouco mais velhas do que nós e isso também poderá ter que ver com o facto de que continuamos um pouco mais agressivos e brutais.


M.I. – Relativamente aos espetáculos ao vivo, no ano passado, em setembro, tiveste a oportunidade de visitar novamente o nosso país. Como foi partilhar o palco com Overkill, Flotsam and Jetsam e Rezet? Com uma base de fãs tão boa em Portugal, podemos esperar outro espetáculo ao vivo para logo após o fim desta situação com a COVID-19?

Penso que é ótimo voltar a Portugal! Temos esta digressão agendada para novembro ou dezembro em Lisboa, com Warbringer e Crisix. Até dezembro, espero que fique tudo resolvido. Era suposto irmos em digressão em maio, mas essa digressão foi adiada para dezembro e, tendo em conta que em maio não nos foi possível realizá-la nem havia qualquer data para Portugal, estou feliz por poder ir agora em dezembro.
A digressão com Overkill foi fantástica. Somos todos bons amigos e tivemos espetáculos incríveis. Penso que têm um conceito muito bom, uma história excelente, ótimas setlists com todos os clássicos… por isso, para mim foi espetacular. Além disso, os Flotsam and Jetsam são uns dos nossos melhores amigos na indústria da música. Já tivemos vários espetáculos com eles desde 1986.


M.I. – A um nível pessoal, cresci a ouvir bandas como Kreator, Slayer e Destruction também. O Thrash Metal foi sempre uma presença constante na minha vida e algo que recuso deixar de parte. Como te sentes quando os fãs te abordam? És constantemente reconhecido na rua, por exemplo?

Depende. Por vezes sou reconhecido em sítios estranhos, no supermercado ou no aeroporto em alguma parte do fim do mundo, mas no fim do dia isto é Heavy Metal. Por isso, não é uma situação em que seja reconhecido em qualquer lado. Mas não há qualquer problema! Por vezes é engraçado. Por exemplo, estava com a minha namorada e uma pessoa vem ter comigo e diz “Ei, sou um fã teu da Rússia” e era um homem de fato e gravata, que mais parecia um banqueiro. Fiquei a pensar “Como assim?!” (risos). Isto só mostra que o Heavy Metal é algo global, com uma grande base de fãs e que está em todos os níveis. Principalmente os fãs como nós continuam a gostar da música, têm conhecimentos sobre a música, ainda têm paixão pela música e isso é sempre fantástico de se ver.


M.I. – Com uma carreira tão longa e próspera, repleta de conquistas, o que te motiva para continuar? Como consegues continuar a ser criativo depois de mais de 30 anos na indústria? Qual é o segredo?

A paixão de o fazer por tanto tempo. A minha banda é a minha vida, não é apenas um trabalho. Faço tudo com grande vontade e com paixão. Por isso, desde que tenha esta paixão, espero que os Destruction permaneçam tão fortes como agora. Não existe grande segredo. Apenas continuar a fazer o que fazemos com paixão. E isso não é diferente de qualquer outro trabalho. O mesmo acontece com a música. Este é o melhor trabalho para mim e estou feliz de poder continuar a fazer isto, por isso, mesmo que tenha tido um dia mau, continuo a dar sempre o meu melhor.


M.I. – Até agora, os Destruction lançaram 16 álbuns de estúdio e esperemos que se sigam muito mais. Com uma discografia tão vasta e rica, se tivesses de escolher uma música como a melhor que já criaste na tua carreira, que música seria essa?

Isso é muito difícil, porque temos sempre um top 10 e temos sempre músicas das quais não desfrutamos tanto… mas, penso que há uma da qual gosto muito e que adoro tocar, que é a “Curse the Gods”. É uma música que toquei demasiadas vezes, mas da qual continuo a gostar muito. Também representa bem a banda, é uma música típica de Destruction, uma autêntica montanha russa de “Groove” e altos berros, e adoro tocá-la ao vivo.


M.I. – És reconhecido como uma das forças motrizes por trás da máquina do Thrash, juntamente com nomes como Kerry King, Lars Ulrich, Dave Mustaine, Mille Petrozza, entre outros... como te sentes ao teres alcançado tamanho estatuto lendário? Conseguiste alcançar tudo o que querias na tua carreira com os Destruction?

Penso que existem sempre mais objetivos a alcançar. Estamos atualmente a trabalhar num filme de Destruction, um documentário profissional. É um olhar por trás da cortina, um filme que a tua mãe poderia ver e dizer “Então é assim que são os músicos de Heavy Metal” (risos). É algo que as pessoas mais velhas podem compreender e ver que não se trata apenas de sexo, drogas e rock n’ roll. É presença de espírito, amor e paixão. Espero que para o próximo ano este documentário esteja concluído.
Além disso, queremos ir em digressão com Kreator, Sodom e Tankard, os “Big 4” alemães. Não irá acontecer este ano e acho que não irá acontecer no próximo ano, mas um dia espero que sim. E nunca tocámos com Judas Priest, adoro Judas Priest! É uma das minhas bandas favoritas. Tocámos com toda a gente, sabes, mas nunca com Judas Priest. Isso seria um grande sonho realizado.


M.I. – Olhando um pouco para a outra face da moeda, existe alguma coisa da qual te arrependas? Algo que gostarias de ter feito de forma diferente?

Aceito o que aconteceu, aceito o passado. É isso que faz de ti a pessoa que és hoje. Sem os problemas e os contratempos, não seríamos as pessoas que somos hoje. Talvez não tivesse assinado os contratos que assinámos quando tínhamos 17 anos com alguns diretores e editoras que enriqueceram connosco, sendo que nós não fizemos dinheiro nenhum. Mas já não importa. Tivemos muita sorte e viajámos por tudo o mundo tantas vezes que não me posso queixar. Não mudaria muitas coisas.


M.I. – Há algo que gostarias de dizer aos fãs aqui em Portugal?

Sim, espero poder realizar esta digressão em dezembro, porque alguns dos espetáculos mais lendários que tivemos aconteceram em Portugal. Como em 1988, com Motörhead. Ainda me lembro disso como se fosse hoje. Foi a nossa primeira vez em Portugal e estacionámos o autocarro fora do recinto e vimos centenas e centenas de fãs a gritar à nossa espera. Mesmo antes do início do espetáculo, havia milhares de pessoas a gritar “Destruction, Destruction, Destruction!” e foi um concerto incrível. Foi mesmo incrível e penso que foi um dos melhores espetáculos dos anos 80. Por isso, temos uma grande história com Portugal devido a esse momento em Lisboa. Será sempre algo mágico nas nossas mentes.


M.I. – Schmier, muitos parabéns por uma carreira deslumbrante, tem sido uma viagem fantástica até agora. Mais uma vez obrigado, foi uma grande honra. Desejamos que tenhas o maior sucesso e toda a sorte do mundo, e esperamos que esta terrível situação acabe em breve para que possamos desfrutar do incrível ambiente eletrizante de um espetáculo de Destruction uma vez mais!

Obrigado! Boa sorte para a recuperação de Portugal, vemo-nos em Lisboa, em dezembro!


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Entrevista por João Guevara