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Entrevista aos Tygers of Pan Tang


Há muito tempo atrás, numa galáxia muito distante, surgiu uma onda musical que viria a revolucionar a música rock como a conhecemos, levando-a a extremos nunca antes atingidos e conquistando soldados para as suas fileiras em todo o mundo: a New Wave of British Heavy Metal. Sem este impulso inicial, seria impensável a existência de bandas como Metallica, Megadeth e Slayer, por exemplo, todas elas fiéis seguidoras do género muito antes de atingirem o sucesso meteórico de que hoje gozam. Aliás, dessas três bandas, os Metallica foram certamente a mais beneficiada, pois foram grupos como Diamond Head, Iron Maiden e Tygers of Pan Tang que levaram Lars Ulrich a procurar por outros músicos para criar o que viria a ser a banda de metal mais famosa do planeta. Passaram quase 40 anos desde o início do heavy metal, e se mais de 95% das bandas que ajudaram a criar o género fecharam portas, outras reformaram-se ou continuam a fazer o que sempre fizeram: lançam álbum atrás de álbum, embarcam em novas tours e fazem as delícias dos fãs originais e de novas audiências, também estas com uma plena noção da importância que essas bandas tiveram no desenvolvimento do género. Os Tygers of Pan Tang fazem parte desta última safra, e estão de pedra e cal, como prova o seu último álbum epónimo de 2016. Rob Weir, guitarrista e falador nato da banda, ainda tem muito para contar.

M.I. – Quase 40 anos depois, não há sinais de abrandamento, e o vosso álbum de 2016 prova-o sem margem para dúvidas. Como é que está a ser a recepção a Tygers of Pan Tang?

O nosso último trabalho é fantástico: foi lançado aquando da nossa tour Britânica, em Outubro, e entrou directamente nos tops ingleses em número 24, nos dinamarqueses em 13 e nos tops AOR em número 1, logo a recepção tem sido mesmo muito positiva, e estamos extremamente satisfeitos com ele.

M.I. – Muitas bandas vêm e vão, mas os Tygers estão no activo há quase 40 anos. Embora vocês tivessem parado durante cerca de 12 anos, os Tygers não conhecem o significado de “ponto final”, pois não?

De maneira nenhuma! Enquanto eu respirar, a máquina dos Tygers não irá parar. Pessoalmente, acho que nunca estivemos tão fortes, neste momento estamos mesmo a incendiar tudo, a camaradagem que alimenta o motor da banda é muito coesa... (pausa demorada) de facto, é uma relação amorosa: não existem cruzamentos, e as personalidades de cada membro funcionam tão bem umas com as outras, como se fosse um puzzle... quando nos encontramos, rimos, temos prazer em rever-nos de novo e em passar um bom bocado; esta vida é tão curta, e quer-me parecer que não rimos o suficiente enquanto cá andamos. Não quero dizer com isto que não devamos levar as coisas sérias a sério, longe disso, mas parece que temos uma nuvem de riso a pairar sobre as nossas cabeças, gostamos muito de conviver uns com os outros.


M.I. – Então os Tygers não é apenas o vosso negócio, porque é um negócio, claro, mas também o vosso estilo de vida?

Certamente! 

M.I. – Será assim, então, uma espécie de terapia?

Acho que sim. Quero dizer, por vezes, a vida tem situações difíceis, todos temos problemas que temos de enfrentar, desde contas a pagar, prazos de entrega, pessoas que temos de sustentar... todos temos famílias, e eu então tenho nove netos...


M.I. – Nove?!

Nove, sim (risos). Temos todos uma montanha para escalar, entendes? E, por isso, precisamos de um escape, de...


M.I. – Um lugar seguro, talvez? Um sítio em que se sintam bem?

Sim, absolutamente! Mesmo em tournée, ensaiamos, rimos, e... sabes... a última noite da tournée, para nós, é sempre muito triste; quando subimos aos quartos do nosso hotel, depois do último copo, e pensamos que, no dia seguinte, vamos despedir-nos uma vez mais para tratar dos nossos assuntos pessoais... hoje, em Portugal, é a primeira data da nossa tour europeia, logo, estamos muito motivados e entusiasmados.


M.I. – Ainda mais porque é a vossa primeira vez em Portugal, portanto.

Exacto, e que recepção fabulosa! Que gente tão especial! 


M.I. – Na verdade, e porque não sou um regular do MHF, não estava à espera de tanta gente e tão pouco da recepção que vocês tiveram aqui, foi realmente impressionante.

Simplesmente fantástica!


M.I. – Não é muito comum, sabes? Mesmo vocês sendo a lenda que são, quero dizer, não têm aquela legião de fanáticos como os Metallica, que desesperam pelo próximo concerto, etc., mas à medida que eu vos fotografava e olhava para o público, vi apreço e respeito genuíno pela banda, e percebi que as pessoas estavam a adorar, sabes? Pessoalmente, o vosso concerto foi o melhor do dia, e foi mesmo muito bem-recebido.

Devemos tudo ao grupo em conjunto, não há individualidades, e acho que é isso que faz de nós o que somos. Estamos agora numa editora dinamarquesa, a Target Records, que investiu mesmo muito dinheiro na promoção do novo álbum; o último single, “Only the Brave”, já teve mais de 100 000 visualizações no YouTube, e foi descarregado mais de 100 000 vezes no Spotify, e quando o tocamos ao vivo e vejo a reacção do público, vejo que está tudo a correr muito bem. Eles chamam-me de “avozinha”, na banda. (risos)


M.I. – Como assim? (risos)

Sou o mais velho na banda, e então dizem que eu sou a pessoa a quem eles se dirigem quando precisam de tratar de alguma coisa. 


M.I. – Nada a ver com os cabelos brancos, então?

(risos) Talvez... tenho vez marcada no cabeleireiro para a semana... (risos) mas isso é outra história. O que acontece é que eu controlo tudo todas as noites para me certificar de que está tudo bem. Eu vejo as coisas pelo ponto de vista do público, e pergunto a mim próprio “Se eu estivesse ali, será que estaria a divertir-me?” ou “Como é que será que o público que ver a banda tocar?”. Eu acho que isso é controlo de qualidade, entendes? É a coisa certa a fazer, porque se estás a fazer aquilo que os fãs gostam, não pode correr mal. Eu disse hoje ao pessoal que, quando toda a gente está a dar 50%, é apenas mais uma banda, só mais uma banda. Mas depois de vermos o público hoje, a aplaudir e satisfeitos, então está a correr bem. É que, depois de veres 6/7 bandas, se não dás o melhor, o púbico percebe que é só mais uma banda. Nós recebemos na mesma, mas não é correcto, não é honesto. Isto faz-me lembrar dos nossos princípios, principalmente das lojas de discos, essas coisas maravilhosas que hoje desapareceram, pelo menos no Reino Unido, agora está tudo na Internet: dava gosto ver as pessoas ir à loja de discos no dia a seguir ao concerto e ouvi-las dizer “Vou comprar o novo álbum dos Tygers, o concerto deles ontem à noite foi espectacular!”, bem, isso é o tipo de coisas que queres na boca das pessoas, satisfação, pois assim sabes que estás a fazer as coisas como deve ser.


M.I. – Com certeza. Aliás, isso também é um dos factores que vos levou a influenciar tantas bandas no princípio dos anos 80. Diz-me: como é que te sentes sabendo que podes chegar ao pé dos teus filhos e netos e dizer-lhes “Eu sou um dos responsáveis pelo aparecimento de bandas como os Metallica”?

Sim, tens razão e, realmente, existem factos a provar isso, sabes? Na verdade, se fores à Wikipedia procurar pelos Metallica, conseguirás ler a transcrição do anúncio que o Lars Ulrich colocou um anúncio no... como se chama o jornal, mesmo? Não me recordo do nome... bom, no anúncio ele procura músicos, e cita-nos e aos Diamond Head como influência. Eles fizeram 4 covers dos Diamond Head e nenhuma nossa... (risos)... por isso, James and Lars, vá lá, venha de lá isso... (risos)


M.I. – Outra coisa: nomeia-me algo de relevante entre os velhos tempos e os dias de hoje. Por outro lado, diz-me uma coisa boa e outra má dessa coisa.

A Internet. Mudou tudo, como é lógico. Sem precisar de ajuda, simplesmente demoliu a indústria musical. E, porque veio para ficar, está de pedra e cal e não irá a lado nenhum, tens que pensar à frente e utilizá-la para tua vantagem. Em 1980, quando saiu o Wild Cat, se um amigo na Austrália quisesse o disco, teria que lho enviar por correio, o que demoraria umas 2 semanas a chegar lá. Agora, um segundo depois de o novo álbum ser lançado, posso enviá-lo para qualquer lado. Essa é a parte boa. Contudo... eu posso enviá-lo rapidamente, mas... o que é que esses amigos recebem? Os ficheiros de som, mas nada mais. É invisível, não lhe consegues pegar, é intangível. Felizmente, o LP parece ter regressado à mó de cima. Deixa-me ser o mais sincero possível contigo e com os teus leitores: nunca fiz download fosse do que fosse. Muito porque nem sei como fazê-lo. Não sou nada tecnológico, sou muito antiquado. A minha neta, que fez ontem 11 anos, saberia fazê-lo. Os miúdos, hoje... tens que acompanhá-los, porque eles aprendem muito rapidamente. A Lyla, a minha neta de 1 ano e meio, basicamente já consegue mexer num iPhone. Ainda não fala inglês fluentemente, sequer, mas já aponta para o iPhone para se fazer entender, para comunicar. 


M.I. – A natureza humana é isso mesmo: para nós, comunicar é quase tão importante como respirar...

Claro que sim, mas entendes o paradoxo? Parece não saber comunicar, mas já sabe mais que eu em certos pontos. Depois, não chega apenas saber usar a Internet – tens que saber convencer as pessoas a comprar o teu novo álbum. Por exemplo, se tivesses noção do tempo, energia e dinheiro que gastámos com o booklet do nosso novo disco... já deste uma olhada?


M.I. – Ainda não tive oportunidade, não, mas dei uma olhadela à capa do álbum e está uma coisa do outro mundo, está mesmo fantástica...

OK, não te vou dizer então como é para que mais tarde possas ver por ti próprio se quiseres, mas adianto-te que cada um de nós tem uma página nele, e não se trata apenas de uma fotografia; quero dizer, tem uma fotografia, mas não só. O nosso baterista, o Craig, criou-o, é uma coisa muito diferente, e sei que nunca viste nada igual. E sei que os teus leitores também nunca viram nada igual, é uma coisa muito bem-feita, logo se comprarem o álbum entenderão.


M.I. – Ou seja, essa parte tangível de que falas é algo essencial para ti, não é?

Exactamente! Não se trata de umas palavras num ecrã, que podes ouvir, mas que, pensando bem, de que se trata? Não consegues folhear nada, não consegues pegar-lhe... não é real, logo, o que é?! Não é nada. Podes fazê-lo pegando no teu telefone, onde o ficheiro se encontra dentro de um nano-micro-chipo... (risos) ou lá como se chama.... mas nem sequer consegues mostrá-lo a ninguém.


M.I. – Nem levá-lo para casa dos amigos e dizer “Bora ouvir isto, é o novo”, assim como nós fizemos no princípio.

Esse é outro ponto, sim. Escolhemos o Spotify para que o álbum pudesse ser transferido, e não custa assim tanto mais comprar o produto real... 


M.I. – Pessoalmente, como consumidor, mas não como jornalista, não entendo por que é que o pessoal compra digital em vez de comprar o produto real.

Nem eu – pelo mesmo preço, compras o CD, e ainda recebes de bónus o booklet, bem como toda a informação que os ficheiros digitais não te oferecem. Além disso, cada produto nosso real traz um código de transferência para obteres gratuitamente o álbum em formato digital e metê-lo no teu telefone, ou lá qual for a feitiçaria que se faz hoje em dia. Mas, acima de tudo, tens o produto tangível, tens o original. Quando eu era miúdo, finais dos anos 50, princípio dos anos 60, ouvíamos lá em casa Elvis e Cliff Richard, num daqueles gira-discos antigos, enormes. Lembro-me de uma inovação que os meus pais compraram na altura, uma novidade chamada auscultadores (risos), e que dava para ouvires o que te apetecesse sem aborrecer ninguém com o barulho, e ao mesmo tempo, pegavas num LP gatefold, que é uma coisa que os miúdos de hoje em dia não fazem ideia do que é, abria-lo, lia-lo enquanto a música tocava, e ficavas imerso numa história fantástica onde devoravas tudo até à última palavra.


M.I. – Era um ritual fantástico, não era?

Era excelente, pá. Posso parecer um velhadas, mas era uma coisa que dava gosto. Agora, clica-se num botão, e já está...


M.I. – Sinais dos tempos, Rob. Para finalizar, e visto que é a vossa primeira vez em Portugal, o que é que estão a achar até agora?

Por onde começar? Esta é a nossa primeira data nesta tournée, e desde a viagem a tudo o que vimos até agora, tem sido brilhante. Bom, excepto a parte das nossas guitarras ainda estarem em Bruxelas...


M.I. – Ah, sim, vocês tiveram problemas com as guitarras, não foi?!

Sim! Apanhámos avião em Manchester, parámos em Bruxelas, e lá tivemos que esperar uma hora para descongelarem o avião. Infelizmente, não pudemos trazer as guitarras pois ainda não tinham chegado, se não perderíamos o voo, logo, preferimos embarcar. Tocámos graças aos generosos seres humanos que tocaram antes de nós, mas infelizmente não deu para o set que gostaríamos de ter tocado. Mesmo assim, ainda demos um bom concerto, o público estava a adorar. Nunca tinha vindo a Portugal, e curiosamente não entendo o que o pessoal inglês diz, porque não parece Espanha, não parece Itália, é Portugal, pronto. Do que vimos até agora, é fantástico, e voltaremos com certeza, os nossos fãs podem contar com isso. Podem também dar uma olhadela ao nosso website, e estejam à vontade para nos dizer olá, para fazer perguntas, somos bastante rápidos a responder, é o nosso negócio, o negócio das pessoas. Para mim, falar convosco antes e depois do espetáculo é um prazer enorme, por isso contactem e disponham.

Agradeço-te imenso pelo teu tempo, e voltaremos a ver-nos um dia destes, com certeza.


Entresvista por João Correia